POR JORGE FIGUEIREDO, VICE-PRESIDENTE DA APVGN, ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DO VEÍCULO A GÁS NATURAL (*)

Os únicos recursos energéticos ainda abundantes no nosso Planeta são o carvão e o gás natural (metano).

O petróleo tem os seus dias contados, pois o seu pico máximo de produção já está à vista, enquanto as disponibilidades de urânio também começam a escassear e a sua mineração já entrou na lei dos rendimentos decrescentes.

O mesmo acontece com o lítio usado em baterias, apesar de anunciada a abertura de uma nova mina a ser aberta em breve em Portugal.

Assim, para a espécie humana o único combustível adequado para transportes que resta e pode ser generalizado numa escala maciça é o gás natural (GN). Com muitas vantagens:

  • Reservas provadas, prováveis e possíveis no nosso planeta suficientes para muitos séculos;
  • Poder ser, ao contrário do petróleo, fabricado pelo homem, uma vez que se trata de um biometano, o qual é uma energia renovável;
  • Ser o mais limpo de todos os combustíveis existentes, pois a molécula de metano (CH4) tem apenas um único átomo de carbono;
  • A sua adopção não implicar qualquer grande revolução tecnológica pois pode ser utilizado nos mesmíssimos motores de combustão interna já existentes, tanto em Ciclo Otto como em Ciclo Diesel;
  • Ser o combustível mais vantajoso do ponto de vista ambiental na óptica “do-poço-à-roda”.

CO2 não é a ameaça

A UE tem andado a perder tempo com o combate a uma emissão que não é poluente: o dióxido de carbono (CO2), o qual supostamente afetaria o clima terráqueo.

Estabeleceu-se assim uma enorme confusão entre ambiente e clima, coisas que são completamente diferentes. Isto, naturalmente, em nada contribuiu para resolver o problema ambiental que aflige as zonas urbanas, o dos NOx e dos PMs.

Portanto, os verdadeiros poluentes lesivos à nossa saúde são:

• Os óxidos de azoto (NOx) e muito em particular o dióxido de azoto (NO2);

• As partículas em suspensão, ou particulate matter (PM10 e PM2,5), as quais são emitidas por todo e qualquer motor de Ciclo Diesel, independentemente do combustível que utilize. Logo, o biodiesel não poderia solucionar o seu problema inerente de poluição.

Eletrificação não é o caminho

Só agora, diante de catástrofes ambientais, a Comissão Europeia começou a actuar mais energicamente no combate aos verdadeiros poluentes e acaba de levar seis países ao tribunal europeu devido à sua inércia no combate às emissões de NOx e PMs [1]

No entanto, a política da UE ainda é errática pois insiste em pseudo-soluções adequadas apenas para determinados nichos de mercado e que não são generalizáveis numa escala maciça.

É o caso dos veículos eléctricos (VEs) e o dos híbridos.

O governo português, no seu seguidismo, tem investido nisto enormes quantidades de recursos que poderiam ser melhor aplicados na boa solução do GN.

As limitações dos VEs e dos híbridos são bem conhecidas:

• A autonomia;

• A sua pouca adequação ao transporte pesado;

• As baterias que explodem;

• Os custos de investimento tanto na aquisição dos veículos como na infraestrutura de abastecimento;

No entanto, há uma outra limitação quase ignorada: é a da escassez de matérias-primas necessárias para a sua fabricação.

Estou a referir-me aos metais fabricados a partir de terras raras.

Ainda que utilizados em quantidades ínfimas, estes metais não podem ser dispensados.

Os veículos elétricos e híbridos podem conter de 9 a 11 kg de terras raras, o dobro da quantidade encontrada nos veículos com combustíveis líquidos

Se o petróleo escasseia, os metais rareiam

Há mais de uma vintena de metais raros essenciais ao bom funcionamento dos veículos elétricos (VEs) e não só, com nomes pouco conhecidos como Lantânio, Cério, Zircónio, Neodímio, Európio, Ítrio, Praseodímio, Disprósio, Térbio, Samário, etc. [2]

Toda a electrónica digital repousa em metais raros e já foi estimado que um VE ou híbrido ligeiro utiliza 9 a 11 kg de metais raros (ver foto), ou seja, o dobro do utilizado por um veículo convencional.

Na óptica dos recursos planetários, os metais raros são – como o nome indica – muito mais escassos que os demais. Mas o problema principal talvez nem sequer esteja aí: o principal é o facto de a sua mineração estar concentrada em muito poucos países.

Um deles é a China, que praticamente monopoliza a maior parte dos metais raros.

Um livro publicado este ano por Guillaume Pitron [3] mostra as verdadeiras batalhas políticas e geopolíticas que se dão em torno das terras e metais raros.

E o Ocidente deu de mão beijada esse monopólio à China pois, devido a campanhas de ecologistas, as minerações e processamentos de terras raras, que existiram em França e nos Estados Unidos, foram encerradas.

Hoje, a China pode impor os preços que quiser às terras/metais raros que exporta e pode, até, recusar o seu fornecimento a quem bem lhe parecer.

Daí que quem tenha poder de decisão sobre os investimentos que moldarão o futuro dos transportes em Portugal deverá meditar sobre o que foi acima aflorado, tendo em conta questões gerais, mas também a importância relativa dos gastos energéticos.

Porque, sabendo-se que apenas 20% do parque automóvel português – o segmento dos veículos “profissionais” – consome 80% dos combustíveis, é por aí que se deve começar a actuar, passando-o todo para o gás natural, comprimido (GNC) ou liquefeito (GNL).

(*) As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente as da APVGN

Bibliografia:

[1] http://europa.eu/rapid/press-release_IP-18-3450_pt.htm
[2] https://pt.wikipedia.org/wiki/Terra-rara
[3] Guillaume Pitron, “La guerre des métaux rares: la face cachée de la transition énergétique et numérique“, ed. LLL, Paris, 2018, 296 p.