A gestão de uma frota automóvel está cada vez mais sob o olhar atento de quem tem responsabilidades administrativas numa empresa. O seu peso financeiro cresce de ano para ano mas, mais do que a mera contabilidade dos números, é a imprevisibilidade dos custos que mais preocupa os seus responsáveis.
Sobretudo por causa de questões relacionadas com as constantes alterações fiscais, que obrigam a novas contas e a novos orçamentos com soluções que permitam minorar os efeitos cada vez mais penalizantes para as organizações.
Mas igualmente questões que se prendem com a própria consciência dos condutores e sensibilidade que revelam quanto à propriedade do automóvel, com reflexos diretos sobre a conservação e utilização da viatura e no que toca à sinistralidade.
Pela primeira das razões, o painel de abertura da 3.ª conferência Gestão de Frotas organizada pela FLEET MAGAZINE foi, seguramente, um dos que mais prendeu a atenção do público.
Algumas formas de minorar os efeitos fiscais sobre as viaturas, nomeadamente a tributação autónoma, foram assuntos trazidos por Renato Carreira, da Deloitte, revelando também as oportunidades que a chamada reforma da “Fiscalidade Verde” pode trazer para a economia das organizações.
Com base numa análise introdutória que realçou as diferenças e evidenciou as vantagens (ou desvantagens), para empresas e ENI, da utilização do leasing, da compra direta ou do recurso ao renting, o analista de uma das mais conhecidas consultoras mundiais revelou métodos para mitigar os efeitos da fiscalidade, nomeadamente através da atribuição de viaturas aos colaboradores.
“A tributação do uso pessoal de viaturas aos colaboradores pode revelar-se globalmente mais vantajosa para as empresas, uma vez que os esses encargos passam integralmente a estar excluídos de tributação autónoma”, foi uma das primeiras razões apontadas.
Salientando a necessidade imperiosa de um acordo escrito entre o funcionário e a empresa, já que esta solução sujeita os colaboradores a maiores encargos fiscais em sede de IRS, Renato Carreira projetou o crescimento exponencial desses proveitos quanto maior for o custo de aquisição da viatura e a remuneração do seu utilizador.
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Como ganhar com a Fiscalidade Verde?
Algumas das medidas incluídas no Orçamento de Estado para 2015, segundo Renato Carreira, poderão implicar mudanças na forma de gestão de uma frota automóvel. Nomeadamente com o aproveitamento das vantagens oferecidas com o aumento do limite do custo de aquisição de viaturas ligeiras de passageiros elétricas, híbridas plug-in, movidas a GPL ou a gás natural, a partir do qual não são aceites como gasto fiscal as depreciações. Ou ainda com a redução, entre 25% a 45%, das taxas de Tributação Autónoma aplicáveis aos encargos dedutíveis com viaturas ligeiras de passageiros a GPL e GNV.
Em sentido contrário, o agravamento do peso fiscal sobre os combustíveis e as alterações nos escalões das taxas de emissão das viaturas poderão representar um encargo adicional que justifica uma abordagem mais “ecológica” na composição e gestão do parque automóvel de uma organização.
Alinhando com esta ideia, Luís Ventura, explicou de que modo as poupanças financeiras alcançadas nos últimos anos pela PFIZER foram acompanhadas de ganhos ambientais impostos pela “Politica Verde” desta empresa, que obriga a uma redução global das emissões de CO2.
“Negociar não é apenas tentar obter o preço mais baixo. Envolve outros fatores que não somente os financeiros e engloba todas as mais-valias que possam revelar-se úteis para a empresa”, salientou o segundo orador da conferência.
Para manter controlados os custos da frota que dirige, Luís Ventura disse que privilegia as aquisições “em bloco” a cada 4 anos, para adquirir maior poder negocial junto de um único fornecedor. Fazendo ainda um apertado controlo de seleção dos modelos que impossibilita a adaptação das viaturas a critérios pessoais e uma gestão de custos atenta ao TCO.
Na seção de perguntas e respostas que se seguiu à sua intervenção, o gestor da farmacêutica teve oportunidade de falar sobre os recondicionamentos das viaturas no final do contrato. “A política atual é a empresa assumir essa responsabilidade”, explicou o orador, admitindo que este procedimento irá certamente mudar em termos globais.
Redução de custos: controlar e responsabilizar o utilizador
Se há custos de um contrato que podem ser previstos ao longo da sua existência, o controlo dos imprevistos pode (e deve) ser minorado através de uma verificação atenta de variáveis que dependem principalmente do modo como a viatura é utilizada.
A necessidade de responsabilizar e consciencializar o utilizador para conseguir atingir reduções com os custos operacionais (consumos, emissões, desgaste da viatura) mas também os efeitos de uma condução menos apropriada (coimas e sinistralidade que leva à imobilização da viatura e, por vezes, a danos pessoais do condutor) acabaram por ser debatidos em dois painéis de discussão da conferência.
A imposição de regras de controlo interno apertadas relacionados com gastos de combustível, foi um dos aspetos evidenciados por Tiago Ferreira ao falar dos métodos de gestão seguidos pela “Estradas de Portugal”. Referiu também a implementação de políticas de responsabilização dos condutores nos casos de sinistro: “Num orçamento de 3 milhões de euros, a implementação destas políticas vai permitir-nos poupar cerca de 500 mil euros”, concretiza o interveniente no painel. “Em caso de sinistro com culpa do utilizador, a EP assume a responsabilidade da franquia dos dois primeiros. Do terceiro em diante essa responsabilidade será imputada ao condutor.
O gestor da empresa que administra cerca de 25% da rede viária de Portugal disse ainda que o grau de comprometimento dos utilizadores das viaturas é assumido por contrato escrito.
Nuno Cruz, da JOHNSON & JOHNSON reforço a importância da formação dos condutores no controlo dos índices de sinistralidade, bem como a prática de uma condução mais eficiente para redução de consumos e para minorar o impacto das emissões sobre a empresa.”
“Mas quando queremos reduzir custos, temos que estar atentos a outras variáveis. Para evitar consequências negativas para o negócio”, reconheceu Nuno Cruz. Embora não seja ainda política da JOHNSON imputar os custos do sinistro ao utilizador, uma das formas encontradas de consciencialização dos seus responsáveis é fazê-los passar um dia na associação SALVADOR, para que possam perceber as consequências nefastas de determinadas atitudes ao volante.
Car Policy: sinistralidade e formas de a evitar
Como a gestão cada vez mais apertada do tempo e a necessidade de cumprir objetivos obriga muitas vezes a uma utilização menos eficiente da viatura, os impactos da sinistralidade voltam a ser abordada por David Pinhol, da Chronopost: aumento do prémio dos seguros, imagem da empresa e imobilização da empresa ou até do próprio motorista.
“Na Chronopost, a sinistralidade representa cerca de 15% dos custos totais da frota”, reconhece o interveniente do painel dedicado a este tema e às políticas da condução.
Dividindo a frota que dirige entre viaturas de uso pessoal e viaturas operacionais, Rui Serra, da PT Pro, realçou os mesmos custos diretos e indiretos apontados por David Pinhol, acrescentando que, depois de analisar exaustivamente os motivos principais dos acidentes, o grupo PT concluiu que se deviam maioritariamente ao excesso de velocidade.
“Este ano adotamos uma política de limitar a velocidade máxima das viaturas a 110/120 km. Isto trouxe vantagens imediatas não apenas em termos de sinistralidade como nas emissões de CO2 e, consequentemente, nos consumos. A nossa taxa de sinistralidade tem vindo a reduzir desde Janeiro, além das viaturas ficarem sujeitas a um menor desgaste”.
David Pinhol destacou a importância da formação dos condutores que, no caso da da Chronopost, passa por formações internas e pela criação de “tutores de segurança rodoviária” com o papel de apoiar os condutores no momento do acidente. Seja orientando-os no preenchimento dos formulários habituais de participação dos acidentes, recolha de testemunhas ou comunicação à seguradora e autoridades.
“Casados, que já não vivem em casa dos pais, com encargos financeiros, com filhos e que se mostram sensibilizados quando, durante a formação, são relatadas consequências dramáticas resultantes de acidentes”, é o perfil de motorista que a Chronopost definiu menos sujeito a acidentes, ao qual dá importância no processo de recruta de novos colaboradores.
“É importante identificar os bons e maus condutores”, concluiu Rui Serra da PT Pro. “Mas também dar aos condutores informações concretas que revelem dados de posicionamento da sua condução face ao padrão normal da frota da empresa. Para isso, desenvolvemos aplicações internas que, durante a condução, alertam para o desempenho e para os reflexos de determinadas posturas, orientando e incentivando o condutor a melhorar comportamentos como acelerações ou travagens bruscas, por exemplo. É importante alterar os comportamentos com formação mas percebemos que é decisivo alertá-las no momento em que são cometidos determinados erros e as consequências que eles produzem.”
Lara Antunes, MARTIFER: Mobilidade global
A expansão internacional das empresas portuguesas está a levar os responsáveis pela gestão de uma frota a lidar com necessidades mais globais de mobilidade dos seus colaboradores.
É o caso da MARTIFER, cujo crescimento e localização geográfica face ao conjunto de obras em que se encontra envolvida, obriga à utilização de outros meios de transporte que não apenas o automóvel.
Revelando a sua própria experiência pessoal e da empresa, Lara Antunes revelou alguns métodos que a MARTIFER usa para garantir a eficaz racionalização dos meios: atribuição de viaturas consoante as necessidades de deslocação e utilização de parques de estacionamento “low cost”, localizados na proximidade dos aeroportos portugueses, como plataforma de apoio nas situações de viagens para o exterior.
A gestão de mobilidade para e fora de Portugal é feita com o apoio de agências de viagens selecionadas, que fornecem os serviços de viagens de avião, hospedagem e se encarregam de garantir formas de deslocação no estrangeiro.
A gestão de todos estes processos gerou a necessidade da MARTIFER desenvolver as suas próprias aplicações, para garantir a correta utilização e racionalização de cada meio.
Joe Carreira, MERCK, SHARP & DOHME: gestão centralizada de custos
Numa das intervenções mais divertidas face à boa disposição do orador, Joe Carreira, da MERCK, SHARP & DOHME trouxe à conferência uma experiência internacional de gestão de uma grande frota.
Que teve contornos complexos no seu início, em consequência do processo de fusão de duas grandes empresas. Uma das exigências foi a necessidade de redução de custos, o que obrigou à implementação de novas metodologias de aquisição e atribuição das viaturas.
Numa empresa global, como a MERCK, SHARP & DOHME, foi delicada a adaptação a novas formas de atuação que implicaram a retirada de determinados benefícios que os colaboradores desfrutavam na escolha do automóvel. Focando na redução de custos mas também das emissões, Joe Carreira revelou que, mesmo assim, foram necessárias adaptações à realidade local de cada mercado. No entanto, quando tal é possível, nomeadamente ao nível de seguros, é privilegiada uma negociação mais alargada possível, como forma de alcançar poupanças mais significativas.
A concentração de recursos, a focalização das necessidades da frota no “core business” da empresa e a profissionalização da gestão deste departamento representou poupanças significativas de 2010 a 2012, que Joe Carreira situa entre 10 e 30% consoante os países.
TCO: A quem importa, que interesse tem?
Diversas razões podem motivar a valorização que é dada a cada um dos parâmetros que compõem o TCO. Esta foi uma das constatações do 4.º painel da conferência, claramente detalhada por Roberto Gaspar, da 4Fleet: “Depende a quem se destina esse TCO. No caso das marcas ou importadores, para que compreendam o posicionamento de determinado modelo perante a concorrência e possam corrigir as desigualdades. Para os frotistas, serão os custos de utilização da viatura e quais os parâmetros onde poderão poupar”.
Já antes, Ricardo Silva, da Leaseplan, tinha explicado como os diversos componentes incluídos num estudo de TCO eram examinados consoante o modelo de financiamento. O responsável da gestora destacou a necessidade dos clientes perceberem a importância global dos valores envolvidos e o peso individual de cada área que compõe o estudo. E de que modo estes podem variar por razões externas, nomeadamente fiscais. Mas não só: “a nossa experiência nos últimos anos tem-nos permitido observar desvios de 30% nos custos de combustíveis, com evidente acréscimo dos custos”, revela Ricardo Silva.
Luís Preto, gestor de frota da Siemens explicou que grau de importância a sua empresa atribui a cada uma das áreas que compõem a análise. Com especial incidência nos reflexos fiscais e nos consumos, geridos internamente pela sua empresa.
Pedro Prazeres do grupo SIVA reforçou a ideia que os gestores não devem olhar apenas para o valor da renda de um contrato, mas estar atentos a cada um dos critérios de um TCO. Não apenas os consumos mas, falando da sua área, para a rapidez e capacidade de resposta dos serviços pós-venda da marca.
Uma análise ao TCO permite ao representante de um modelo corrigir ou limitar os aspetos menos competitivos de um determinado modelo, admitiu o responsável pelo pós-venda da SIVA, seja o custo de um determinado componente de manutenção ou até o valor da mão-de-obra.