A Fleet Magazine falou com Ricardo Ferreira Reis, o investigador responsável por um estudo encomendado pela Associação de Leasing e Factoring à Universidade Católica, cujas conclusões se souberam em Abril, e tentou perceber como é que as empresas olhavam para estes instrumentos de financiamento.
Ricardo Ferreira Reis coordenou um estudo sobre a utilização de leasing e renting nas PME
Dos dados do estudo, é possível concluir que o renting é utilizado exclusivamente para veículos?
Não exclusivamente, mas quase. Isso ficou bem claro na análise. Há muito pouca utilização do renting em equipamento industrial. Primeiro, porque há muito pouco investimento em equipamento industrial neste momento, sobretudo de PME. E depois porque há muita hesitação em apoiar a aquisição deste tipo de equipamento em leasing porque estes equipamentos são costumizados e, como tal, não têm mercado em segunda mão. Este tipo de financiamento é muito mais adequado a equipamentos que tenham um grande valor em segunda mão.
A distinção entre leasing e renting foi pouco precisa de início…
Sim, tivemos que fazer um trabalho de análise para saber, dentro dos que utilizavam leasing, quais os que o faziam em leasing e renting ou apenas neste último. As conclusões foram interessantes. Coincidindo com o que era a nossa expectativa, ficou claro que a vantagem de preço é maior no renting apenas do que no leasing e isso prende-se com o tal alto valor residual, que permite antecipar em renting esse beneficio na prestação a pagar.
O facto de se falar sobretudo de automóveis no renting, também condiciona a resposta da adaptabilidade, dado que este tipo de bem é mais adaptável. A dispensa de garantias adicionais também é importante, mas não surpreendente, porque de facto não se dá garantias nenhumas – o veículo é a garantia. Outra vantagem do renting muito referenciada é a agregação de outros serviços. Não era muito importante para o leasing, mas é no renting.
E onde é que estão as desvantagens?
Na facilidade de aquisição. Os utilizadores de renting não consideram a facilidade de aquisição uma vantagem do renting, precisamente porque na prática não se está a adquirir coisa nenhuma. Se eu quiser mesmo adquirir, o renting não é a melhor estratégia. Além disso, os utilizadores não identificam benefícios fiscais no renting. À semelhança aliás do que sucedeu no leasing.
Não há benefícios fiscais directamente, mas há outro tipo de benefícios contabilísticos…
Mas não tem benefícios fiscais por aí. A existir, seria algum tipo de amortizações ou qualquer outra coisa que de facto não tem…
Mas acha que as empresas estão à espera desses benefícios para fazer investimentos em renting?
Não sei, mas se calhar sim. O facto de termos valores tão baixos na utilização do renting pode estar relacionado com a inexistência de benefícios fiscais. No leasing, acontece o mesmo.
Isso significa que estes modelos de financiamento não têm vantagens operacionais por si?
Fiscalmente, não têm. Mas operacionalmente, sim. Aliás só isso explica porque é que o mercado não morreu. Ainda há essas outras vantagens.
A teoria financeira dizia que não há diferença nenhuma entre usar leasing ou renting e um financiamento bancário, exceto se houver benefícios fiscais. No entanto, em Portugal, continua a existir leasing e renting, e sem benefícios fiscais. As vantagens, que mantêm o setor vivo, vêm, por exemplo, do montante das prestações do renting ser mais baixo. Esse benefício no montante das prestações mais baixas decorre do renting reter muito valor residual e não de benefícios fiscais.
Agora, as nossas taxas de utilização são muito mais baixas que no resto da Europa, sobretudo nas microempresas. E, porventura, isso até é explicável porque estas são criadas sobretudo para aproveitar benefícios fiscais. Como não há benefícios fiscais no renting, estas empresas não utilizam renting. Nas outras empresas, onde a adaptabilidade do financiamento, onde o provimento de serviços adicionais e as garantias colaterais são mais relevantes que os benefícios fiscais, encontramos padrões de utilização semelhantes ao resto da Europa.
Pode então concluir-se que essas empresas não vão para o leasing e renting porque não percebem benefícios fiscais?
Não os percebem ou não têm mesmo.
E, por outro lado, pode-se concluir que estas empresas não percebem os benefícios diretos do produto em si?
Pode ser que estes benefícios não se adaptem diretamente a este tipo de empresas tão pequenas ou neste período de estagnação económica. E esse é um dos pontos que o estudo procura relevar. São empresas que não cresceram ainda porque não tiveram investimento. E não o tiveram porque as outras vantagens não se lhes aplicam e não há um benefício fiscal. Por exemplo, imagine um pequeno dentista e que pode crescer. Mas, se não tem nenhuma vantagem em promover o investimento no equipamento do consultório, não vai deixar nunca de ser um pequeno dentista.
Isso a nível de investimento de equipamento. E do automóvel?
O que estamos a reparar é que o pequeno dentista já tem o automóvel em renting. Provavelmente, o motivo por que tem a micro-empresa é para ter o automóvel em renting. Não é para ter o equipamento de dentista, que era o que podia estar em renting também. É isso que notamos. O investimento que estas micro-empresas têm em renting é sobretudo em automóveis.
Outra conclusão surpreendente é a nível dos canais de acesso.
Sim, não estava à espera de que houvesse um papel tão preponderante da banca no acesso ao leasing e ao renting.
Mas mesmo tendo todas as hipóteses de financiamento em cima da mesa, quando as empresas vão à banca preferem em maior parte o crédito. Porquê?
Os bancos têm objetivos comerciais e o leasing e o renting não estão numa posição de destaque no banco. Mas estamos no domínio das hipóteses, sem forma de conseguir validar esta conclusão.
E porquê? Terá a ver com a taxa de juro?
Sim, mas as taxas são mais altas no crédito do que no leasing porque os mercados conduziram a que fosse assim. E são-no porque as garantias são muito maiores no caso do leasing e muito menos arriscado. Essa taxa reflete o nível de risco. Numa altura em que os bancos estão a precisar de baixar os níveis de risco, estão a apostar em elevadas rentabilidades no crédito e não na redução do risco que o leasing e o renting trazem.
(originalmente publicado na edição nº17 da Fleet Magazine. Veja o PDF aqui)