Na primeira parte da entrevista, Rui Nobre, diretor geral adjunto de operações (COO) da DPD em Portugal, explica as razões que fizeram a DPD Portugal avançar para o processo de transição energética da sua frota de distribuição urbana em Lisboa e no Porto. Revela-se também a dimensão, composição e modelo de financiamento da frota de veículos no nosso país
A intenção de estender este movimento de descarbonização a todo o país vai depender de estarem asseguradas as condições para fazê-lo sem afetar a operacionalidade das viaturas.
A primeira fase desse projeto representou um investimento superior a 3,6 milhões de euros e envolveu a aquisição de 55 eSprinter à Mercedes-Benz Portugal e de 55 postos de carregamento para viaturas elétricas à Repsol.
Conteúdo deste artigo
O maior desafio são as estruturas de carregamento
A vossa experiência com a mobilidade elétrica não começa com as eSprinter. Vemos que na frota já existem outros furgões igualmente elétricos…
A Kangoo e a Master foram as primeiras experiências que realizámos na eletrificação.
Foi a primeira Master elétrica que surgiu em Portugal e marca a nossa posição na descarbonização da frota.
A Citroën e a Nissan são dois carros que temos no Porto, a operar para um cliente que pediu que a distribuição das suas encomendas fosse feita exclusivamente por viaturas elétricas.
Neste processo de transição qual foi o maior desafio que a DPD Portugal teve de enfrentar?
A questão das infraestruturas de carregamento. A que temos na sede em Lisboa é muito exigente ao nível da potência elétrica que requer e talvez tenha sido essa a questão que nos desafiou mais.
Realizar um estudo prévio às possibilidades de carregamento dos veículos elétricos seria um conselho que deixaria para quem está a embarcar nesta aventura?
As infraestruturas de carregamento público para veículos profissionais da área logística, nomeadamente dentro das cidades, são praticamente inexistentes.
Portanto, alguém que queira embarcar neste desafio, claramente tem de garantir antes uma estrutura própria de carregamento.
Podia haver um pouco mais de colaboração, tentámos algumas, mas, aparentemente, ainda é um bocadinho cedo e algumas posições ainda são muito rígidas. Por isso, foi necessário encontrar soluções próprias de carregamento.
Do meu ponto de vista, este é o principal desafio. Depois, há que ter muita atenção à questão das autonomias, que nem sempre correspondem ao anunciado pelas marcas. O melhor conselho é: testem os carros.
Por último, diria que, como ainda nos encontramos numa fase de evolução muito acelerada, não devem estabelecer-se compromissos de longo prazo. Porque está tudo a mudar: hoje uma viatura propõe uma autonomia de 150 quilómetros, daqui a um ano provavelmente 220 ou 250 quilómetros…
É preciso manter alguma flexibilidade. No nosso caso, realizámos em 2021 o concurso dos 55 carros, mas os 70 carros para 2022 são um concurso distinto.
Proveitos e custos da transição energética
É possível quantificar quantas toneladas de CO2 deixam de emitir com esta decisão?
Na cidade de Lisboa, estes 55 carros vão provocar uma redução de 87% de CO2.
Mas, mais importante do que isso, vão reduzir 84% do NOx, as pequenas partículas que são ainda mais nocivas para a saúde.
Não são valores que estamos a atirar para o ar, resultam de cálculos feitos por instituições bastantes credíveis na área ambiental e inclusivamente corroborados pelo Eng.º Francisco Ferreira da Associação Zero.
E a quantificação em termos de poupança de custos de utilização. Também já foi feita?
Havia alguma preocupação neste aspeto. Pensávamos que íamos ter o custo muito acrescido, porque as viaturas elétricas são mais caras e o diferencial entre o consumo de gasóleo e o consumo de eletricidade não iria atenuar a diferença do custo de aquisição.
Há algum tempo, as próprias locadoras também estavam um bocadinho reticentes, porque não sabiam bem como fixar os valores residuais para um veículo com estas características.
Hoje tudo mudou um pouco; vamos admitir que os custos não são tão elevados quanto imaginámos inicialmente!
Além dos benefícios fiscais previstos, puderam contar com mais algum apoio na transição energética da frota?
Não. Nem sequer o que existe, não vale a pena. A descarbonização das cidades, a diminuição da pegada carbónica, etc., toda a gente gosta muito de abordar o tema, mas ninguém está disposto a pagar.
Desde as autarquias aos governos, até os próprios utilizadores. Fala-se muito de uma nova política ambiental mas depois, quando é para pagar, é uma chatice. Claramente devia haver mais consciência também em relação à questão dos custos. Porque alguém tem de pagar esta mudança.
Os utilizadores das viaturas elétricas receberam algum tipo de formação?
Sim, os operacionais. Formação nossa, da DPD Portugal, já que temos uma equipa habilitada para fazê-lo.
Receberam também alguma formação da Mercedes-Benz e a marca continua a dar essa formação consoante as carrinhas vão sendo entregues.
E qual tem sido a recetividade?
Tem sido uma surpresa. Pensávamos que iam chegar ao final do dia praticamente sem bateria, que iriam abusar… mas até agora não!
Tem corrido muito bem. E os condutores gostam muito. Para eles, só o facto de a transmissão não ser manual já é uma mais-valia tremenda. Além da condução ser mais silenciosa. Por isso, o feedback tem sido ótimo.
Eletrificação da frota administrativa
No que respeita às viaturas administrativas? Há tendência para fazer a mesma transição dos modelos de passageiros?
Em cada escalão de atribuição propomos vários modelos que o utilizador pode escolher. Incluindo carros elétricos.
Em alguns casos, até com o benefício de poderem escolher um carro com valor de aquisição um pouco mais elevado, pelo facto de ser elétrico. Para incentivarmos que faça essa escolha.
A questão tem sido as autonomias. No meu caso, hoje estou em Lisboa, amanhã estou no Porto, depois de amanhã em Faro… e não temos ainda uma infraestrutura de carregamento, uma agilidade e uma rapidez de carregamento que torne eficiente este tipo de deslocações. Isto ainda é um problema.
Seguramente, nos próximos três ou quatro anos, as autonomias vão aumentar bastante, as possibilidades e a rapidez de carregamento vão tornar o processo mais rápido. Daí que acredite que, nessa altura, a nossa frota administrativa seja cada vez mais elétrica.
Mesmo assim, já temos alguns colaboradores com carros elétricos, especialmente de pessoas que vivem na zona de Lisboa e que fazem poucos quilómetros. Por isso já temos carros elétricos na frota administrativa e viaturas plug-in.
Há quem diga que o plug-in deve-se em parte aos benefícios fiscais, mas não. É realmente uma solução interessante, porque em cidade torna-se possível conduzir apenas em modo elétrico.
Desde que disponham de possibilidade de carregamento e que o façam…
Os colaboradores com carro da empresa têm aqui, na sede da DPD Portugal, toda a estrutura de carregamento disponível durante o dia. Quando precisam de fazer uma viagem maior utilizam o gasóleo ou a gasolina, consoante o tipo de carro.
Temos a vantagem de dispor de uma infraestrutura de carregamento em Lisboa e no Porto – onde está concentrada a maior parte do pessoal administrativo. É chegar, ligar a tomada e o carro fica a carregar enquanto o condutor está a trabalhar.