Num projeto apoiado pelo Fundo Ambiental ao abrigo da Estratégia Nacional para a Mobilidade Elétrica, em 2017 o grupo Águas de Portugal deu início a um processo de transição de parte da sua frota de veículos com motor a combustão para unidades 100% elétricas
Martins Soares, Presidente do Conselho de Administração da AdP Energias, empresa que tem por missão promover uma eficiente gestão da energia em articulação com as empresas do grupo, foi um dos intervenientes no debate sobre os desafios das empresas na transição para a mobilidade elétrica, que decorreu na 8.ª Conferência de Gestão de Frota, realizada em 2019.
Na altura pôde descrever a experiência do grupo Águas de Portugal nesse processo desencadeado com um concurso público internacional lançado em agosto de 2017. Um dos efeitos foi a redução da emissão de mais de 326 toneladas de CO2 e o consumo de mais de 173 mil litros de combustível em apenas dois anos e mais de dois milhões de quilómetros percorridos por 128 ligeiros de passageiros e de mercadorias, que começaram a operar no início de 2018.
O que desencadeou o processo de eletrificação da frota?
O Grupo AdP consome cerca de 1,5% de toda a energia utilizada em Portugal e os custos com a aquisição de energia são o FSE (Fornecimento e Serviços Externos) mais representativo da sua estrutura de gastos.
Os projetos de eficiência energética, de produção de energia elétrica 100% renovável para autoconsumo e a redução das emissões de gases com efeitos de estufa são prioridades no domínio da energia.
Com esse objetivo desenhámos e temos em implementação o Plano de Eficiência e Produção de Energia – PEPE -, a desenvolver no período 2017 a 2020, onde a introdução à mobilidade elétrica é umas das principais marcas.
Neste sentido, o grupo AdP candidatou a substituição de 127 viaturas em fim de vida, com motor térmico, por viaturas 100% elétricas, processo que veio a ser concluído no ano de 2018.
Quais os desafios com que se depararam no imediato?
O principal desafio, para além da formação dos condutores, teve como referência a infraestrutura de carregamento das viaturas elétricas. A opção recaiu na instalação de uma rede própria, composta por 134 carregadores de diferentes tipos, espalhada pelo território continental, por forma a cobrir as necessidades de carregamento das viaturas operacionais 100% elétricas.
Os resultados já obtidos comprovam a pertinência da solução adotada, tornando independente o Grupo AdP da rede pública, que ainda apresenta inúmeros constrangimentos e ineficiências que se esperam poder ser corrigidos proximamente, com a sua concessão a entidades externas dessa rede.
https://fleetmagazine.pt/2020/08/05/frota-grupo-aguas-de-portugal/
Rede privada de carregadores do grupo Águas de Portugal
Pode detalhar o trabalho de distribuição das viaturas elétricas pelas diferentes áreas geográficas, levando em linha de conta a autonomia das viaturas e as necessidades de carregamento para assegurar a sua operacionalidade?
A distribuição das viaturas pelo território dependeu das necessidades das empresas na substituição de viaturas operacionais em fim de vida.
Como já referi, a estratégia do grupo AdP passou pela instalação de uma rede privada de carregamento de viaturas elétricas, assegurando uma colocação em função dos percursos utilizados na gestão operacional das empresas.
Como é que a decisão foi recebida e implementada junto das chefias de cada empresa e, sobretudo, qual tem sido a aceitação por parte dos utilizadores das viaturas elétricas? Houve formação dos condutores para a eco condução?
O processo foi trabalhado internamente tendo sido bem aceite a introdução à mobilidade elétrica.
Conduziu inicialmente a uma validação dos percursos operacionais nas tarefas de operação e manutenção das empresas, contemplou a formação em condução com viaturas elétricas e no carregamento destas viaturas e a inclusão da georreferenciação na frota do grupo é um processo que está atualmente em curso.
O projeto de introdução da mobilidade elétrica obrigou-nos a ter em conta toda a frota, elétrica e térmica, tendo sido desenhado como objetivo a certificação da frota das empresas do Grupo AdP.
Este processo, que se iniciou em 2018, foi concluído no final de 2019 com a certificação da frota por parte da ADENE, na qualidade de entidade gestora dessa certificação.
Que balanço pode ser feito, nomeadamente em termos de redução de custos, poupança de emissões?
Registamos resultados muito positivos: em 2019, os 128 veículos 100% elétricos que integravam frota de serviço do Grupo AdP (com 1.430 viaturas) percorreram mais de 2 milhões de quilómetros, tendo evitado o consumo de mais de 173 mil litros de combustíveis de origem fóssil e que representa uma redução de 582 barris equivalentes de petróleo. Em termos de energia primária, a redução foi de 57,5% (-85,1 toneladas equivalentes de petróleo), e o consumo elétrico foi de 293 MWh.
Em termos de emissões de CO2, a redução alcançada face aos veículos com motor térmico foi de 382 toneladas (-82,9%).
Em nenhum momento a operacionalidade foi afetada?
A mobilidade elétrica está perfeitamente enraizada no Grupo AdP, estando no presente momento perfeitamente integrada nas rotinas de exploração das nossas empresas.
Ultrapassados os desafios iniciais com a eletrificação da frota, quais os presentes e futuros nesse caminho?
O Grupo AdP tem presentemente em discussão o seu plano para o reforço da mobilidade elétrica, com o objetivo de ter a sua frota totalmente ou fortemente elétrica até 2030.
A situação atual pode interferir nas decisões do grupo em relação à frota, tomadas antes e depois desta fase complicada?
A situação atual pode introduzir alguns constrangimentos na estratégia definida, em face dos constrangimentos que o mercado já apresenta, com dificuldades no cumprimento das entregas de iaturas, sejam elétricas ou outras.
Que medidas tomaram em relação às viaturas e/ou utilizadores? Excetuando a operacional, houve redução na quilometragem efetuada pelas restantes unidades? Tendo isso acontecido, pode motivar ou está a ser equacionado o adiamento da renovação?
A atividade operacional não foi afetada com os efeitos da pandemia da Covid-19, tendo as empresas assegurado os serviços públicos de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais na sua totalidade.
Naturalmente, com uma forte percentagem dos colaboradores em trabalho remoto, verificou-se uma redução da quilometragem das viaturas associadas aos serviços de suporte.
No presente momento não se perspetiva um adiamento do processo de renovação, exceto se, como se referiu, por dificuldades do mercado automóvel em face da paralisação da grande maioria dos fabricantes.
https://fleetmagazine.pt/2020/07/27/os-custos-da-transicao-energetica/
Que mensagem ou sugestão deixaria para quem dá agora os primeiros passos rumo à mobilidade elétrica?
- O processo de substituição de frota deve ter em conta as características das viaturas a substituir, as áreas e os percursos, bem como a quilometragem média, por forma a atingir uma substituição adequada ao serviço prestado.
- Deve ser tido em consideração a existência de uma rede própria de carregamento de viaturas elétricas, por forma a tornar a frota independente das incapacidades que ainda se verificam na rede pública.
- Um projeto de mobilidade elétrica é uma oportunidade para repensar os percursos operacionais e deve ser acompanhado de outras medidas como a formação, a georreferenciação e certificação da frota operacional.