O percurso da Mobilidade Elétrica em Portugal deve muito ao papel que empresas e entidades públicas tiveram para o desenvolvimento deste mercado e para a crescente aceitação das viaturas elétricas por parte dos condutores, em uso profissional ou particular, porque contribuíram para desfazer muitas dúvidas e receios que existiam em relação a este tipo de veículos.
Na edição de junho de 2022, a revista FLEET MAGAZINE faz uma breve retrospetiva histórica do trajeto da Mobilidade Elétrica em Portugal, evidenciando precisamente o contributo das frotas profissionais.
Este dossier dedicado ao percurso da Mobilidade Elétrica em Portugal e ao contributo das empresas para o seu desenvolvimento é complementado com testemunhos das principais marcas automóveis presentes em Portugal, bem como o de algumas gestoras de frota que operam no mercado nacional.

 

2014: Reforma da Fiscalidade Verde

A chegada de automóveis elétricos a Portugal e a sua comercialização aconteceu antes de 2014, mas este foi o ano que consagrou em lei a Reforma da Fiscalidade Verde (lei n.º 82-D/2014).

Publicada a 31 de dezembro de 2014, para vigorar, portanto, a partir de 2015, a lei de reforma da política ambiental introduzia um conjunto de benefícios para a aquisição de veículos elétricos, híbridos elétricos, híbridos plug-in e com motor híbrido, mas também automóveis com motor a funcionar a GPL ou GNC.

Paralelamente, agravava as taxas de Imposto sobre Veículos (ISV) nos veículos a gasolina e gasóleo, em função das emissões de CO2.

Dirigidos aos clientes profissionais (empresas e ENI), estes eram os benefícios fiscais mais importantes diretamente relacionados com a aquisição e utilização de viaturas:

  • A faculdade de dedução do IVA nas “despesas relativas à aquisição, fabrico ou importação, à locação e à transformação em viaturas elétricas ou híbridas plug-in, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas elétricas ou híbridas plug-in, quando consideradas viaturas de turismo”, assim como “em viaturas movidas a GPL ou a GNV, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas movidas a GPL ou a GNV, quando consideradas viaturas de turismo”;
  • Taxas reduzidas de Tributação Autónoma “no caso de viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in”, assim como nas “viaturas ligeiras de passageiros movidas a GPL ou GNV” (a lei n.º 2/2014 já havia excluído desta tributação os “veículos movidos exclusivamente a energia elétrica”);
  • Estabelece um novo regime para as depreciações e amortizações, para efeitos do IRC, dos veículos movidos exclusivamente a energia elétrica, veículos híbridos plug-in e veículos movidos a GPL ou GNC, limitando, por outro lado, as restantes viaturas (híbridas e com motor exclusivamente a gasolina ou gasóleo).

Em 2014 foram matriculados em Portugal apenas 189 veículos elétricos e 101 automóveis híbridos plug-in. Representavam apenas 0,2% do total de viaturas ligeiras de passageiros novas matriculadas nesse ano. O Renault ZOE foi o modelo elétrico mais vendido com 34 unidades e o Mitsubishi Outlander o primeiro PHEV, com 32 unidades

FM 53 – Revista Fleet Magazine – Junho 2022

2015, ANO 1 do arranque da Mobilidade Elétrica em Portugal

Embora a Reforma da Fiscalidade Verde contemplasse também medidas com benefícios dirigidos aos consumidores particulares, nomeadamente através de uma redução do valor de ISV no momento da aquisição da viatura (“Incentivo Fiscal ao Abate de Veículos em Fim de Vida”), a relevância das três medidas anteriores mostrava a importância que o legislador atribuía ao papel das empresas enquanto motor da transição energética.

De facto, a Fiscalidade Verde possuía motivos suficientes para despertar o interesse dos clientes profissionais.

A Fiscalidade Verde contribuiu para que, nas contas finais do mercado automóvel de 2015 (que cresceu 25% face a 2014), o número de registos de automóveis 100% elétricos subisse de 189 (em 2014) para 645 unidades (em 2015), enquanto o de híbridos plug-in multiplicava-se cinco vezes, encerrando o ano com 521 matrículas.
Modelos mais vendidos em cada uma das categorias foram o Nissan LEAF, com 209 unidades, e, novamente, o Mitsubishi Outlander, com 229 registos. Ainda assim, a soma de automóveis de passageiros exclusivamente elétricos e híbridos plug-in representou nesse ano apenas 0,65% da categoria de ligeiros de passageiros, sendo praticamente inexistente este tipo de oferta entre os ligeiros de mercadorias

Contudo, dois factos com impacto para a Mobilidade Elétrica em Portugal ocorreram em 2015:

  • A MOBI.E, enquanto empresa pública, assume o papel de Entidade Gestora da Rede de Mobilidade Elétrica (EGME), com responsabilidades na gestão e monitorização da rede de postos de carregamento elétricos;
  • Em meados de 2015, a 12 de agosto, é publicada a portaria 241/2015 que estabelece os requisitos técnicos para atribuição de licença para o exercício da atividade de operação de pontos de carregamento da rede de mobilidade elétrica.

concurso publico mobi.e

Criação da rede pública de carregamento elétrico

O fim do incentivo ao abate terminou com a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2017.

O governo justificou o fim da medida com a fraca adesão à iniciativa, sendo substituída pelo “Incentivo pela Introdução no Consumo de um Veículo de Baixas Emissões”.

A 9 de junho desse ano, a publicação do decreto-Lei n.º 60/2017 introduzia um conjunto de objetivos estratégicos para o desenvolvimento de uma política alternativa à utilização de combustíveis fósseis e consequente integração de mais energia proveniente de fontes renováveis na atividade económica, dedicando especial atenção para o sector dos transportes: “tendo em conta as características atuais do mix energético nacional, a utilização de combustíveis alternativos nos transportes, designadamente da eletricidade no transporte rodoviário, configura uma opção estratégica de grande interesse para o objetivo de incorporação de energia de fontes renováveis no sector e principalmente para o objetivo de redução de emissões nacionais de GEE, pela via da descarbonização dos transportes”, lê-se no documento.

Com este diploma, terminologias como “Ponto de carregamento”, “Ponto de carregamento de alta potência”, “Ponto de carregamento de potência normal”, “Ponto de carregamento ou de abastecimento acessível ao público” e até “Veículo elétrico” passaram a ter o enquadramento legal necessário para a uniformização de nomenclaturas, algo essencial para, por exemplo, a identificação na elaboração de propostas para a instalação, acesso e exploração pública (ou não) de equipamento e serviços destinados ao exercício de atividades necessárias à mobilidade elétrica.

A 27 de outubro de 2017, no âmbito da 6.ª Conferência Gestão de Frotas realizada no Centro de Congressos do Estoril, Nuno Bonneville, então administrador da MOBI.E, apresentava alguns dados do projeto-piloto para a mobilidade elétrica iniciado nesse mesmo ano (que se previa ficar concluído em 2018), a tipificação e cobertura da rede de carregamento à data, bem como a estrutura do que se pretendia vir a ser o modelo de funcionamento de uma rede pública de carregamento de veículos elétricos, com a abertura do mercado a operadores privados.

Algo que veio a acontecer em outubro de 2018, com o início do pagamento das operações de carregamento de carros elétricos.

Mobilidade elétrica: carregamento pago só em postos rápidos. Como é feita a operação.

No final de 2017, as matrículas de veículos elétricos e híbridos plug-in representavam cerca de 1,9% do mercado automóvel em Portugal; um ano depois, com o importante contributo dos 100% elétricos, esse peso já era de sensivelmente 3,4%, sendo que 2018 foi o ano do pico do número de registos automóveis em Portugal, depois de 2003

Nesses dois anos os carros elétricos mais matriculados foram o Renault ZOE e o Nissan LEAF, não sendo certamente alheio o facto de estar a decorrer uma renovação da frota do Estado, com a transição energética de 1.200 automóveis provenientes de diversos organismos geridos ou tutelados pelo governo e que tinham mais de 10 anos.

CONTINUA:

COMO AS FROTAS DO ESTADO E DAS EMPRESAS CONTRIBUIRAM PARA O CRESCIMENTO DA MOBILIDADE ELÉTRICA