RICARDO SOUSA É ENGENHEIRO MECÂNICO E EX-DIRETOR DE PÓS-VENDA DA HYUNDAI EM PORTUGAL. É COLABORADOR REGULAR DA FLEET MAGAZINE
Mais importante do que discutir os ‘timings’ anunciados para a chamada dos carros afetados às oficinas, interessa explicar os possíveis efeitos da solução apresentada pela VW para os motores 1.6 TDI que é, no mínimo, interessante pelo facto de aparentemente ser tão simples e tão pouco dispendiosa.
Logo, fica no ar a interrogação sobre o motivo de não ter sido desde logo utilizada.
Mas antes de explicar as possíveis consequências da solução, vamos tentar perceber o que vai ser feito.
As medidas de alteração técnica, propostas e aceites pela autoridade alemã responsável pelos transportes, consistem na instalação de um “flow transformer”, um limitador de fluxo, logo à entrada do sensor de massa de ar (MAF) do motor 1.6 TDI.
Na prática, a malha do MAF é usada para atenuar a turbulência do fluxo de ar e, desta forma, garantir que o sensor consegue efetuar uma medição mais precisa.
O sensor de massa de ar mais conhecido é o da Bosch, utilizado por mais de 22,2 milhões de veículos em operação, incluindo europeus. Este sensor dispõe de uma malha antes do sensor, calibrada exatamente para fornecer uma medição precisa da quantidade de ar de admissão.
Além disto, a VW fará uma reprogramação do referido motor.
Os blocos 1.2 TDI e 2.0 TDI vão necessitar apenas, segundo a VW indica, de uma atualização do software.
Depois de efetuadas as referidas alterações, os modelos em questão cumprirão com os valores de emissões estipulados pela lei.
E este “estrangulador” resulta?
Se por um lado a solução pode garantir o cumprimento das emissões, poderá não ser inteiramente verdade para o consumo de combustível.
Isto porque, se na situação anterior a gestão eletrónica permitia que mais poluentes passassem através do sistema de escape, economizando combustível, agora o motor deverá usar regularmente mais combustível para que o sistema que retém óxidos de azoto, reduzindo as emissões tóxicas, execute o seu “trabalho”.
Para explicar o motivo da dúvida não existe outra forma que não excessivamente técnica para alguns leitores: é que o rendimento máximo de um motor térmico, dado pelo ciclo de Carnot, é a razão entre o trabalho que o engenho fornece e o calor que sai da fonte quente. A sua demonstração é um pouco extensa e sai fora do âmbito deste artigo, ainda assim é possível escrever o rendimento de Carnot em função das temperaturas da fonte quente e da fonte fria utilizando a relação η = 1- Tq/Tf.
Como apenas parte da energia sob a forma de calor, que o ciclo absorve da fonte quente é transformado em trabalho, dado que a restante energia sob a forma de calor é enviada para a fonte fria, constatamos que uma máquina térmica nunca terá rendimento de 1 (100%), ou seja, não consegue transformar todo o calor fornecido em trabalho.
Se bem que os motores a diesel são mais eficientes do que os motores a gasolina. A compressão da mistura gasosa de ar e combustível é superior no motor a diesel, o que resulta em maiores temperaturas de combustão, ou seja, mais energia proveniente do combustível é aproveitada para realizar trabalho.
Ora, ao que parece, a economia de combustível foi precisamente a razão pela qual a programação do software da Volkswagen terá sido alterado, tornando os carros mais poluentes e elevando as emissões de NOx acima dos valores homologados, de acordo com os investigadores do International “Council on Clean Transportation”.
Que sistemas existem para redução do NOx?
Abordagem às medidas técnicas propostas no âmbito do “dieselgate” e aos vários métodos utilizados para a redução do NOx
Não querendo ser demasiado exaustivo, vou nomear apenas as técnicas mais utilizadas pelos principais fabricantes. Quer durante o processo de combustão interna, como os designados de pós tratamento:
– Recirculação de gases de escape (EGR): alimentação controlada de gases de combustão para dentro da câmara de combustão. É um método eficaz para a redução dos níveis de óxido de azoto (NOx) na fase de combustão.
Quando a mistura de ar/combustível queima, a temperatura sobe e a formação de óxidos de nitrogénio aumenta a uma taxa desproporcionalmente elevada. A recirculação de uma porção do gás de escape (excluindo o oxigénio) novamente para a câmara de combustão baixa a temperatura dentro dos cilindros, reduzindo, desta forma, a taxa de formação de NOx durante o processo de combustão, ou através do controlo da concentração de oxigénio. Para cumprir com as exigentes normas EURO VI, as EGRs mais recentes são arrefecidas.
A maioria dos motores modernos exige a recirculação dos gases de escape, como tecnologia avançada, para satisfazer as normas de emissões. Habitualmente é usado nestas configurações um turbocompressor de geometria variável (VGT) para otimizar o canal de gases de escape em gamas de baixa, média e alta velocidade para produzir a máxima potência.
Seguem-se agora as principais tecnologias de pós-tratamento adotadas para o EURO VI, como meio de redução do NOx.
– Lean NOx Trap (LNT): absorve os Óxidos de Azoto (NOx) e Óxidos de Enxofre (SOx) por oxidação catalítica, convertendo-os em dióxidos.
Os NOx são retidos por reação com nitratos, reagem com o metal alcalino (Ba, Ce) e são armazenado em estado de nitrato. Em modo de rico de mistura, portanto com escassez de oxigénio, esta reação é feita à custa de injeção extra de combustível,
O LNT pode substituir um DOC (Catalisador de Oxidação do Diesel) no sistema atual de arquiteturas escape, o que pode significar baixo custo em comparação com uma arquitetura DOC-DPF padrão.
O (LNT) Lean NOx Trap depende de injecção adicional de combustível, como meio para reduzir os NOx. Aqui reside a sua desvantagem, já que, teoricamente, consome mais combustível por causa do combustível adicional requerido para libertar e converter os óxidos de azoto e enxofre (NOx e SOx) armazenados.
Por isso, pode ser responsável pelo aumento das emissões de CO2.
Por exemplo o novo motor UII 1.1/1.4 do novo i20 da Hyundai, e certamente muitos dos actuais motores a diesel de baixa cilindrada, adoptaram esta tecnologia para cumprimento da norma EURO VI.
– Conversor catalítico Selectivo (SCR): converte o óxido de nitrogênio (NOx) integrado nos gases de escape em nitrogênio e água, sem libertação de subprodutos indesejáveis.
A conversão ocorre usando uma solução aquosa de ureia produzida sinteticamente, a mais comum das quais é o AdBlue®, fornecido por um depósito auxiliar.
A substância contém 32,5% de ureia e vai sendo gradualmente adicionada a montante do coletor de escape do conversor catalítico SCR.
Esta substância é dispensada de acordo com a velocidade do caudal mássico dos gases de escape e é precisamente regulada pelo sistema de gestão do motor, que recebe a informação do sensor de NOx atrás do catalisador SCR.
Trata-se de uma tecnologia não assim tão recente. Os veículos comerciais pesados têm vindo a utilizar SCR e AdBlue® há algum tempo, bem como a área industrial e o sector marítimo. Agora esta tecnologia está a ser aplicada em automóveis de passageiros, por força da norma de emissões de poluentes Euro 6.
– Filtro de Partículas Diesel (DPF) montado conjuntamente com um Catalisador de Oxidação Diesel (DOC) acoplado: arquitetura padrão DOC-DPF para cumprimento das normas EURO V.
Contudo, esta estrutura evoluiu necessariamente nos atuais motores EURO VI, para atingir reduções de emissões ainda maiores. Principalmente para as partículas em suspensão (PM), mas em vez do DOC, é combinada com sistemas SCR (SCR-DPF) ou sistemas LNT (LNT-DPF).
– Filtro de Partículas Diesel (DPF): sistema para a remoção da fuligem dos gases de escape dos motores diesel, efetuando a regeneração de forma passiva.
O filtro usa um revestimento catalítico contendo metais preciosos, que reagem com as partículas nocivas emitidas pelo motor, dispensando a necessidade de um aditivo.
O processo de regeneração passiva envolve a conversão lenta das partículas depositadas no conversor catalítico em CO2. Este procedimento tem lugar numa faixa de temperaturas entre os 350-500⁰ C, e prossegue continuamente sem a necessidade de quaisquer medidas especiais, principalmente quando o veículo é utilizado predominantemente em autoestrada.
Só quando o veículo é operado durante períodos mais longos sob uma carga mínima, como em tráfego urbano, existe um aumento ativo da temperatura do gás de exaustão, até cerca de 600° C, para que as partículas depositadas no filtro sejam queimadas.
Esta regeneração adicional do filtro é conseguida à custa das pós-injeções de combustível, a cada mil ou dois mil quilómetros.
E então? Qual é a melhor solução?
O sistema SCR é proposto como primeira escolha para veículos de maior porte, que requerem alta eficiência de conversão de NOx e estão sujeitos a quilometragens elevadas.
A tecnologia LNT é considerado uma alternativa mais atraente para veículos mais pequenos, com menor necessidade na eficiência de redução de NOx.
No entanto, a escolha apropriada da tecnologia de pós-tratamento, bem como o layout do sistema de escape, é avaliada em função de cada aplicação específica “tipo e categoria de veículo”, e nomeadamente os valores das emissões em diferentes ciclos de condução.