A fiscalidade em torno das viaturas ligeiras de passageiros ou viaturas de turismo sempre foi objeto de muita controvérsia e sempre foi um sector de atividade económica muito apetecível para arrecadar receita fiscal.

Para além do imposto sobre veículos (ISV) que tributa o fabrico, montagem, importação e do imposto único de circulação (IUC) que tributa a propriedade/utilização, temos a tributação autónoma em sede de IRC e o direito à dedução do IVA.

https://fleetmagazine.pt/2020/07/08/tributacao-autonoma-perguntas-e-respostas/

Em matéria de tributação autónoma, o Código do IRC estabelece uma tributação autónoma sobre os encargos efetuados ou suportados por sujeitos passivos que não beneficiem de isenções subjetivas e que exerçam, a título principal, atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, viaturas ligeiras de mercadorias referidas na alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto sobre Veículos (CISV), motos ou motociclos, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia elétrica, às seguintes taxas:

  • 10% no caso de viaturas com um custo de aquisição inferior a 27.500 euros;
  • 27,5% no caso de viaturas com um custo de aquisição igual ou superior a 27.500 euros e inferior a 35 mil euros;
  • 35% no caso de viaturas com um custo de aquisição igual ou superior a 35 mil euros.

São considerados encargos as depreciações, rendas ou alugueres, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização.

Esta matéria foi objeto de muita controvérsia quando foi acrescentada à tributação autónoma com o OE/2015 as viaturas ligeiras de mercadorias e a confusão foi instalada à data.

Considera-se que as viaturas ligeiras de mercadorias que são objeto de tributação autónoma são as que são tributadas pela alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do CISV – Tabela A do CISV.

São viaturas com mais de três lugares e caixa fechada similares aos ligeiros de passageiros, mas são classificados como de mercadorias.

Na grande maioria, os ligeiros de mercadorias são tributados pela tabela B do CISV, que tem em conta apenas a cilindrada, pelo que os mesmos não se inserem na alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do CISV.

Estes são os ligeiros de mercadorias que, pelas suas características, são tributados pela tabela B e, residualmente, pela tabela A:

  • Ligeiros de mercadorias até três lugares, são tributados pela tabela B, pelo que não estão sujeitos a tributação autónoma;
  • Ligeiros de mercadorias com mais de três lugares, de caixa aberta ou sem caixa (incluem-se as pick-ups) são também tributados pela tabela B e não estão igualmente sujeitos a tributação autónoma;
  • Para os ligeiros de mercadorias com mais de três lugares, com caixa fechada, há a distinguir as seguintes situações: se tiverem dois eixos motores (4×4), são tributados a 100% das taxas da tabela A (taxa normal), ficando assim sujeitos à tributação autónoma; Se tiverem um eixo motor (4×2), só são tributados à taxa normal da tabela A se não reunirem os requisitos definidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 8.º, ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º, ou ainda na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º, todos do CISV;
  • Ligeiros de mercadorias com o peso bruto igual a 3.500 kg, um eixo motor (4×2) com caixa aberta ou sem caixa (ou quadro) ou, se de caixa fechada, não tenham a cabina do condutor e passageiro(s) integrada na carroçaria, estão fora da incidência do ISV, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do CISV, pelo que não estão sujeitas a tributação autónoma.

Esta distinção muito técnica causa dúvidas sobre a sujeição ou não a tributação autónoma, no caso de veículos adquiridos em estado de uso, ou perante a frota de veículos existentes no ativo da empresa.

Como forma de dissipar as incertezas, pode ser consultado o simulador de cálculo do imposto sobre veículos que consta no Portal das Finanças.

https://fleetmagazine.pt/2020/03/30/isv-carros-usados-importados/

Parecer da Autoridade Tributária

A Autoridade Tributária (AT) pronunciou-se sobre esta matéria numa informação vinculativa de 2015 (Processo n.º 750/2015), que vem dizer que veículos que, embora sejam homologados tecnicamente pela entidade competente (Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P.) como “ligeiros de mercadorias” (considerados da categoria N1 – veículos concebidos e construídos para o transporte de mercadorias com massa máxima não superior a 3,5 t), assemelham-se pelas características específicas com que se apresentam (de que se destaca desde logo a carroçaria e a lotação de 4 ou 5 lugares) como ligeiros de passageiros, razão pela qual são tributados em sede de ISV pela taxa normal da tabela A, sendo-lhes aplicável idêntico tratamento ao previsto para os automóveis de passageiros – vide artigo 7.º, n.º 1, alínea a) do CISV.

A AT considera também que, caso o veículo seja tributado pela taxa intermédia prevista no artigo 8.º, n.º 3 ou por uma das taxas reduzidas a que se refere o artigo 9.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 (ambos do CISV), estará desde logo afastado da tributação autónoma prevista no artigo 88.º, n.º 3 do CIRC.

Conclui a AT que estão sujeitas à tributação autónoma prevista as viaturas ligeiras de mercadorias que para efeitos de ISV sejam tributadas às taxas normais deste imposto, ou seja, as previstas na tabela A constante do n.º 1 do artigo 7.º do respetivo código.

Os operadores económicos, e sobretudo os contabilistas certificados, devem analisar o certificado de matrícula e junto da AT verificar qual a classificação das viaturas no âmbito do CISV.

Ainda no que respeita à tributação autónoma, o CIRC não exclui explicitamente as viaturas que se encontram classificadas como mercadorias, ou seja, viaturas destinadas a venda, apenas exlcuindo as que se destinam no âmbito da atividade normal a serem alugadas ou afetas ao serviço público de transportes e ainda quando sejam tributadas na esfera da categoria A (como rendimento em espécie).

Esta ambiguidade ou lacuna na redação da Lei causa mau estar no sector de venda e revenda de viaturas, pois, pese embora não sejam depreciadas, têm outros encargos que são objeto de tributação autónoma. Ora, o espírito do legislador ao tributar autonomamente as viaturas ligeiras de passageiros era onerar viaturas registadas no imobilizado e não em mercadorias.

https://fleetmagazine.pt/2020/08/03/tributacao-autonoma-iva/

IVA dedutível

O direito à dedução do IVA parece-nos menos objeto de controvérsia e é estabelecido nos seguintes termos:

  • Não é possível o direito à dedução do IVA da aquisição, fabrico ou importação de viaturas ligeiras que não tenham mais de 9 lugares, incluindo o condutor, excluindo quando as viaturas são para venda ou constituam o objeto de atividade do operador económico;
  • Viaturas até 3 lugares, chamadas “comerciais”, o IVA é dedutível;
  • Viaturas elétricas ou híbridas plug-in, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas elétricas ou híbridas plug-in, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na portaria a que se refere a alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC, o IVA é dedutível;
  • Viaturas movidas a GPL ou a GNV, de viaturas ligeiras de passageiros ou mistas movidas a GPL ou a GNV, quando consideradas viaturas de turismo, cujo custo de aquisição não exceda o definido na portaria a que se refere a alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC, o IVA é dedutível em 50%;
  • Despesas respeitantes a eletricidade utilizada em viaturas elétricas ou híbridas plug-in.

A Portaria referida é a Portaria n.º 467 de 2010 que estabelece os seguinte limites:

  • Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas adquiridas no período de tributação iniciado em 1 de janeiro de 2010 ou após essa data, o montante é fixado em 40 mil euros;

Para as viaturas ligeiras de passageiros ou mistas adquiridas no período de tributação que se inicie em 1 de janeiro de 2011 ou após essa data, o montante é:

  • 45 mil euros relativamente a veículos movidos exclusivamente a energia elétrica;
  • 30 mil euros relativamente às restantes viaturas não abrangidas na alínea a).

Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas adquiridas nos períodos de tributação que se iniciem entre 1 de janeiro de 2012 e 31 de dezembro de 2014, o montante é:

  • 50 mil euros relativamente a veículos movidos exclusivamente a energia elétrica;
  • 25 mil euros relativamente às restantes viaturas não abrangidas no ponto anterior.

Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas adquiridas nos períodos de tributação que se iniciem em 1 de janeiro de 2015 ou após essa data, o montante é:

  • 62.500 euros relativamente a veículos movidos exclusivamente a energia elétrica;
  • 50.000 euros relativamente a veículos híbridos plug-in;
  • 37.500 euros relativamente a veículos movidos a gases de petróleo liquefeito ou gás natural veicular;
  • 25 mil euros relativamente às restantes viaturas não abrangidas nos pontos anteriores.

A fiscalidade automóvel é complexa, sendo o sector automóvel sempre muito “castigado” quando é necessário arrecadar mais receita fiscal, devendo, em nosso entender, ser necessário clarificar algumas ambiguidades como a tributação autónoma de viaturas classificadas como de mercadorias.