Em 2019 as vendas de veículos elétricos terão batido novos recordes. A consultora McKinsey estima que se venderam cerca de 2,2 milhões de automóveis plug-in de passageiros em todo o mundo, traduzindo-se numa quota de mercado de 2,5% (1 em 40 carros novos). A mesma antevê que entre 2020 e 2025 cheguem ao mercado cerca de 400 novos modelos elétricos. Por seu lado, a Boston Consulting Group dá conta do atual frenesim ao reportar que os 29 principais construtores planeiam investir na produção de elétricos mais de 300 mil milhões de dólares nos próximos dez anos e ainda que as vendas de veículos com algum tipo de eletrificação totalizarão um terço das vendas em 2025 e ultrapassarão a mítica marca dos 50% em 2030.

A década parece chegar assim ao fim com a hegemonia centenária do motor de combustão interna posta em causa. Ainda que o diesel e a gasolina prometam continuar a ter um papel a desempenhar, a próxima década será previsivelmente marcada pela aceleração da transição e adoção em larga escala de veículos elétricos.

Debrucemo-nos sobre os fatores que sustentam esta perspetiva.

A indústria automóvel vai continuar a lidar com um conjunto crescente de restrições e incentivos por parte dos governos dos países e cidades. Por exemplo, na Europa está em curso um ambicioso plano cujo objetivo é atingir a neutralidade carbónica em 2050 (ou seja, anular o balanço entre as emissões e as remoções da atmosfera, por exemplo pela floresta). Metas muito exigentes de redução de emissões de CO2 ditam gigantescas multas aos fabricantes que não cumpram os limites estipulados, impactando negativamente o TCO (Total Cost of Ownership) dos veículos de combustão interna. Em sentido contrário observamos que atualmente 24 dos 28 estados membros da União Europeia têm algum tipo de incentivo fiscal com o objetivo de estimular a venda de veículos elétricos reduzindo o seu TCO. A nível local as cidades prometem continuar a ter um papel fundamental, se não decisivo na transição. Várias cidades já têm ou vão ter alguma forma de proscrição que vai desde as simples zonas de emissões reduzidas até à proibição total de circulação de veículos de combustão interna.

Atualmente os elétricos representam um enorme desafio para a rentabilidade dos fabricantes. O seu custo de desenvolvimento e produção é enorme e as margens pequenas, se não negativas. No entanto, apesar das dores de crescimento vemos emergir novos modelos de cooperação entre construtores e formas de desenvolvimento de produto pensadas de raiz para a eletrificação, o que em conjunto com os avanços da tecnologia e economias de escala tenderá a fazer baixar o custo do produto (especialmente das baterias), gerando rentabilidade sustentável a breve trecho.

As infraestruturas de carregamento são vitais para a adoção em massa dos veículos elétricos. Aqui espera-se que andem a par o rápido crescimento das vendas e os investimentos das entidades públicas, fabricantes e outros fornecedores na instalação em larga escala de carregadores garantindo progressivamente modelos de negócio sustentados, promovendo um saudável equilíbrio entre a oferta e a procura.

À medida que o preço desce, a autonomia aumenta e as infraestruturas de carregamento se tornam omnipresentes é expectável que mais consumidores vejam no veículo elétrico uma opção fiável e confortável para as suas necessidades de mobilidade, levando a uma adoção em massa desta tecnologia.

Desenhar um cenário onde chegamos ao final da próxima década com o mix de vendas constituído em partes mais ou menos iguais entre pura combustão interna (diesel e gasolina), híbridos e veículos elétricos talvez não seja muito ousado. A indústria automóvel apesar do enorme desafio de se preparar para o futuro ao mesmo tempo que assegura a sua sustentabilidade atual mostra-se bem colocada para dar a sua contribuição para o desmame global e faseado dos combustíveis fósseis. A questão que se coloca de seguida é se isto chega. Provavelmente não. Especialmente nas cidades, soluções de transportes públicos mais eficientes e outras formas complementares de mobilidade mais leve e interconectadas são imprescindíveis para garantirmos a nível local uma proteção da saúde pública e a nível global um combate eficaz às alterações climáticas.