Nos dias que correm, informação é, cada vez mais, sinónimo de poder. Pelo que a antecipada ponderação de todos os aspetos contabilísticos e fiscais inerentes à detenção de uma viatura, para uma otimização na utilização dos recursos e ferramenta disponíveis, pode traduzir-se em eficiência fiscal e financeira. Pretendemos com este artigo alertar para alguns pormenores sobre os quais um bom gestor deve refletir aquando da sua aquisição.
A viatura, enquanto item do ativo fixo tangível, será sujeita a depreciações de acordo com o seu período de utilidade esperada. Será através deste procedimento, de registo do gasto com a depreciação, que se “recupera”, numa ótica económica, o seu custo de aquisição. Na esfera fiscal, dentro das balizas impostas entre período mínimo e período máximo de vida útil, e tendo por base o valor máximo de aquisição legalmente fixado, esses gastos serão fiscalmente aceites.
Basicamente, ao longo dos anos de utilização dessa viatura, dentro dos períodos mínimo e máximo de vida útil, poderão existir gastos com depreciações que serão, ou não, fiscalmente aceites atendendo ao seu valor de aquisição. Estes gastos, quando tratamos de viaturas ligeiras de passageiros (e algumas de mercadorias) estão sujeitos a Tributação Autónoma.
Um aspeto que não é habitualmente ponderado é o registo do valor residual. O valor residual de um ativo é a quantia estimada que uma entidade obteria correntemente pela alienação de um ativo, após dedução dos custos de alienação estimados, se o ativo já tivesse a idade e as condições esperadas no final da sua vida útil. Assim, quando determinada entidade adquire uma viatura, sabendo de antemão que ao fim de certos anos de utilização a irá vender e espera por essa venda ainda recuperar um certo valor, fará todo o sentido, logo aquando do seu registo em termos contabilísticos, considerar o seu valor residual.
Naturalmente que a análise do que é mais ou menos vantajoso, depende sempre da situação em concreto e dos objetivos pretendidos a curto e longo prazo. Cada caso é um caso, e aquilo que para um pode ser benéfico, pode não o ser para o outro.
Mas falemos das potenciais vantagens que podem resultar do facto de se considerar o valor residual da viatura.
Depreciar com ou sem VR
A que nos parece mais evidente será visível aquando da sua venda, após decorrido o período do seu uso. Vamos admitir que se pretende utilizar a viatura durante quatro anos, sabendo o valor de venda que ela terá ao fim desse tempo.
Por norma, se se pretende utilizar a viatura durante quatro anos, esta é sujeita a depreciações a uma taxa de 25%. Quando no quinto ano esta viatura é vendida, o seu valor de venda traduz-se num ganho tributável nesse ano.
Ora vejamos: estivemos durante quatro anos a considerar um gasto com essa viatura, para no quinto ano se apresentar um gajo sujeito a imposto (partindo do pressuposto que não há lugar a reinvestimento).
Neste primeiro exemplo, consideramos uma viatura adquirida por 20 mil euros, com um período de vida útil de quatro anos. Sendo que, se espera, venha a ser vendida no quinto ano por cinco mil euros. Trata-se de um exemplo meramente académico que pretende alertar para a problemática do valor residual e para a análise das implicações daqui resultantes.
No cenário em que não é considerado valor residual, esta viatura origina um gasto anual com depreciações de cinco mil euros. Ao fim dos quatro anos está totalmente depreciada. No quinto ano, quando se procede à sua venda, esse valor de realização será integralmente tributado, configura uma mais-valia que concorre para o apuramento do lucro tributável, no pressuposto de que não há lugar a reinvestimento.
Já no cenário em que se considerou a existência de valor residual, o gasto anualmente considerado com a sua depreciação foi menor, atingindo 3.750 euros/ano. Ao fim dos quatro anos esta viatura apresentava uma quantia escriturada de cinco mil euros, pelo que sendo vendida por esse mesmo valor não há qualquer mais-valia nessa data.
Admitimos que o segundo cenário será mais aproximado com a realidade económica, isto é, não foram "aumentados" os gastos com a sua utilização, pois a perspetiva seria recuperar esse valor com a sua venda.
Numa situação real deverão ser consultados guias e informações do mercado por forma a melhor aproximar a determinação do valor residual à situação em concreto.
Impacto da Tributação Autónoma
Outro aspeto que importa considerar na hora de registar a viatura como ativo fixo tangível é a sujeição a Tributação Autónoma, especialmente nas situações em que antecipadamente sabemos que a viatura irá ser vendida por certo valor ao fim de alguns anos.
Vejamos agora outro exemplo, com uma viatura adquirida acima do limite legal previsto para efeitos fiscais (por exemplo diesel, o limite é de 25 mil euros), sendo a taxa de Tributação Autónoma aplicável de 35%.
Além do aspeto relacionado com a mais-valia que se mantém neste exemplo, aqui importa também analisar o peso da Tributação Autónoma.
Atualmente a Tributação Autónoma incide sobre os gastos incorridos, sejam, ou não, fiscalmente aceites. Pelo que a depreciação contabilizada será sujeita a Tributação Autónoma.
No primeiro cenário, em que não foi considerado valor residual, a depreciação total de 60 mil euros origina uma Tributação Autónoma de 21 mil euros, sendo que 12.250 euros correspondem a Tributação Autónoma sobre gastos não dedutíveis em termos fiscais. No quinto ano, aquando da venda, o seu valor de realização concorre integralmente para o apuramento do resultado tributável, no pressuposto de que não há reinvestimento. Será caso para pensar, para que é que durante quatro anos se avolumaram gastos sujeitos a Tributação Autónoma, se depois se apura um rendimento?
No cenário em que se considera um valor residual de 15 mil euros, não se apura qualquer mais-valia na data da sua venda, pois o valor de venda corresponde à quantia escriturada nesta data. Comparativamente ao outro cenário, verifica-se que o encargo com a Tributação Autónoma ao longo dos quatro anos foi inferior em 5.250 euros (21.000-15.750). Poderá admitir-se uma melhor gestão financeira do negócio?
Lembramos que quando há a atribuição de valor residual à viatura, a depreciação fiscal tem que ser proporcionalmente ajustada. E também que a taxa de Tributação Autónoma a aplicar será sempre a correspondente ao valor de aquisição e que, na existência de prejuízos fiscais, normalmente, esta sofre um acréscimo de 10 pontos percentuais. Naturalmente que a par desta informação os gestores deverão ponderar a intenção de reinvestimento. Por último, referir que a existência de acordo de utilização da viatura pelo trabalhador afasta a sujeição da mesma a Tributação Autónoma.
Esperemos que as diversas dimensões analisadas sobre este tema possam contribuir para uma melhor gestão fiscal das empresas.