A Proposta do XXII Governo Constitucional, liderado pelo PS, e apresentada no final de Outubro de 2019, aponta para a criação de medidas que poderão alterar a forma como as empresas gerem as suas viaturas.

Justificando com a necessidade de descarbonização dos transportes, apesar das intenções anunciadas não conterem medidas concretas quanto à sua aplicação, o actual Governo parece pretender incluir no Orçamento de Estado para 2020 custos fiscais mais elevados para os veículos com combustíveis fósseis e sem fins operacionais, em benefício dos modelos com locomoção elétrica, apoiando ainda as empresas que promovam a utilização de veículos partilhados e de transportes públicos.

A partir da página 61 do texto “Mobilizar incentivos económicos à descarbonização” do Programa do Governo pode ler-se, entre outros sinais dessas intenções:

“Importa eliminar os incentivos prejudiciais ao ambiente, como as isenções associadas ao uso de combustíveis fósseis, e revitalizar a taxa de carbono, através de um sinal de preço forte. Em paralelo, as receitas geradas devem ser aplicadas em medidas de descarbonização. Neste contexto, o Governo irá:

  • Iniciar um movimento de reequilíbrio fiscal, em linha com o objetivo de transição justa, mediante a transferência progressiva da carga fiscal sobre o trabalho para a poluição e o uso intensivo de recursos;
  • Prosseguir com a eliminação dos subsídios prejudiciais ao ambiente, em particular as isenções e benefícios fiscais associados aos combustíveis fósseis e as isenções de taxa de carbono (exceto quanto ao comércio europeu de licenças de emissão);
  • Conferir uma clara vantagem fiscal aos veículos elétricos e reforçar a discriminação positiva dos veículos de melhor desempenho ambiental, mantendo a tributação em função das emissões de CO2;
  • Alterar o enquadramento fiscal de modo a que as entidades empregadoras tenham menos propensão para disponibilizar carros de empresa (ou, pelo menos, que disponibilizem apenas veículos elétricos) e, ao invés, mais vantagens em comparticipar a utilização dos transportes públicos;(…)”

Mais à frente, pode ler-se ser também que o Governo quer “promover uma mobilidade urbana mais eficiente, sustentável e integrada”, com “uma forte aposta no transporte público e na sua intermodalidade com a bicicleta”.

Para isso acontecer, o executivo pretende “apoiar o desenvolvimento de redes cicláveis e áreas livres de automóveis, através da requalificação do espaço público e outras formas de mobilidade ativa” e da “criação de planos de mobilidade sustentável por parte de grandes polos atratores ou geradores de deslocações (por ex. equipamentos de serviços públicos, grandes empresas)”, alinhando incentivos com as medidas propostas.

A proposta refere ainda a intenção de “estimular a descarbonização das frotas de logística urbana através da substituição de frota a combustão por bicicletas convencionais e/ou com assistência elétrica“, expandindo e promovendo o “projeto ‘Cycling and Walking’, transformando Portugal num destino mundial para rotas pedestres e clicáveis”.

Como se pode entender este conjunto de intenções do governo?

O executivo ainda está na fase inicial de estudo das medidas que vão ser avançadas, soube a FLEET MAGAZINE.

Mas, baseando a avaliação tanto nas declarações de Matos Fernandes, Ministro do Ambiente como na Proposta do Orçamento do Estado para 2019, o actual Governo poderá desejar aumentar o conjunto de incentivos à eletrificação das Frotas e do uso de recursos partilhados, como os transportes públicos.

Face ao que se pode ler do programa, o executivo pode voltar a propor uma revisão em alta dos escalões de Tributação Autónoma, uma vez que este imposto é aplicado apenas aos veículos de passageiros (pretendendo, com isso, atingir sobretudo os “carros de função”, uma vez que tanto os veículos comerciais, como os elétricos, se encontram isentos deste imposto e existe uma redução de taxas para os “plug-in”).

Porém, para que esta e outras medidas de carácter fiscal possam ter sucesso, o Governo precisa de reunir maioria na Assembleia da República, o que não aconteceu em 2019. Nessa altura, algumas das medidas foram revertidas graças aos projectos apresentados pelo CDU e pelo CDS, após um intenso trabalho de sensibilização desenvolvido pela ACAP.

Fica em aberto a questão da dedução dos 50% do IVA do gasóleo ou da extensão deste benefício à gasolina utilizada pelos carros plug-in (como declarou em entrevista o Ministro do Ambiente), ressalvando que a primeira seria altamente penalizadora para as empresas com frotas de veículos ligeiros de mercadorias, enquanto a segunda levanta dúvidas quanto ao modelo de afetação do custo da gasolina somente a um tipo de veículo em particular.

Quase certo é o Governo pretender vir a manter ou mesmo estender os benefícios aplicados ao uso de veículos partilhados – carsharing empresarial, nomeadamente -, bem como às empresas que promovam formas de mobilidade sustentáveis, tanto para fins operacionais como junto dos seus colaboradores nas deslocações profissionais (incluindo casa-trabalho-casa).

Pode isto significar que poderemos vir a assistir cada vez mais à disponibilidade de pacotes de mobilidade multimodais (que incluam automóvel partilhado e outras formas de transporte), mas também a que cada vez mais empresas transfiram a responsabilidade do automóvel para a esfera do colaborador.

Esta poderá bem ser uma das formas das instituições acautelarem a eventualidade de medidas futuras ainda mais penalizadoras no âmbito da propriedade automóvel, reduzindo, por outro lado, os custos com os transportes.

Por fim, as empresas podem ver as suas necessidades de mobilidade urbana agravadas com o aumento de vias cicláveis e destinadas exclusivamente a transportes partilhados (incluindo públicos), além de outras medidas de restrição à circulação urbana, como a redução de zonas de estacionamento ou o aumento das taxas aplicáveis para o efeito.

A proposta de Orçamento de Estado deve ser conhecida em meados de Dezembro.