POR RENATO CARREIRA, PARTNER DA DELOITTE. É COLABORADOR REGULAR DA FLEET MAGAZINE

A tributação sobre os automóveis é recorrentemente usada para assegurar receitas fiscais.

Tem sido uma garantia de arrecadação de impostos, multiplicando-se os tributos especiais que incidem sobre a propriedade e a utilização dos automóveis (representando em 2015 cerca de 20% do total das receitas fiscais arrecadas em Portugal), isto é, mais de 7,5 milhões de euros, se atendermos à previsão das receitas arrecadadas em 2018.

Mais recentemente, os governos têm recorrido à tributação para incentivar soluções ecologicamente mais sustentáveis e penalizar os automóveis mais poluentes e menos “amigos” do ambiente.

Mas tendo a tributação associada aos automóveis uma importância relevante, será que os países estão preparados para uma perda de receita fiscal resultante dos novos ecossistemas e soluções de transporte que se perspectivam?

Muito embora ainda não seja claro se o número de veículos em circulação vá diminuir significativamente em virtude das novas soluções de mobilidade que se antecipam, em especial no seio das cidades, para já parece ser indiscutível que os veículos ecologicamente mais sustentáveis vão substituir gradualmente (e provavelmente de forma acelerada nos anos mais próximos) os veículos movidos a motores de combustão.

No caso concreto da Noruega, os números divulgados já apontam para que a maioria das vendas de veículos ocorre entre aqueles que são híbridos ou eléctricos.

Por outro lado, têm sido os próprios países que têm utilizado o sistema fiscal como mecanismo de promoção das boas práticas em termos da utilização dos automóveis, criando um conjunto de benefícios fiscais que promovem a aquisição e utilização de veículos menos poluentes.

A consequência é a erosão das receitas fiscais, agravada ainda pela intenção já manifestada por muitos países em proibir, numa primeira etapa, a comercialização de carros a diesel, para depois decretarem o fim da possibilidade de introdução no mercado de veículos movidos a motores de combustão.

São vários os países europeus que já tornaram públicas as suas intenções neste sentido e mesmo Portugal tem como objectivo ser neutro em carbono em 2050.

Aproveitando a consciência social do impacto adverso que os automóveis movidos a motores de combustão têm sobre a preservação do Planeta e sob o signo de influenciar comportamento ecologicamente mais sustentáveis, têm vindo a ser agravados diversos impostos associados à aquisição e utilização dos automóveis.

É comum a introdução e/ou agravamento dos impostos sobre viagens, produção de energia poluente (por exemplo, a partir do recurso a combustíveis fósseis) e aquisição e utilização de veículos movidos a motores de combustão.

Estes agravamentos têm permitido compensar a perda de receita fiscal por via da política de incentivos e pela evolução favorável da venda de carros eléctricos e híbridos.

Mas há ainda que salientar a importância acrescida que começam a ter serviços de “carsharing” e “carpooling” ou mesmo outras formas inovadoras de movimentação nas chamadas cidades inteligentes, mais eficientes e com menos congestionamento de tráfego.

Neste sentido, poderão ter que vir a aumentar de modo significativo os impostos sobre o uso de estradas e infraestruturas públicas, sobre as viagens de passeio e/ou transportes colectivos de passageiros, permitindo aos países compensarem de modo sustentado a perda de receita tributária que se perspectiva para os próximos anos sobre propriedade, aquisição e utilização de veículos e em função das novas soluções de mobilidade.

Assim, não é fácil concluir e determinar como e quando ocorrerá a plena compensação da perda sobre a receita fiscal que se perspectiva, mas é provável que, à medida que novas soluções de mobilidade surgem em ritmo acelerado, ocorra um aumento no nível de tributação para empresas e particulares em função da utilização e aproveitamento dessas mesmas soluções de mobilidade.