No atual contexto que enfrentamos, é evidente que as dificuldades por que passam as pessoas e as empresas são muito significativas. A dimensão da crise económica na grande maioria dos países do mundo é de tal modo expressiva, que a expectativa é que a recuperação possa demorar vários anos.

Ao nível do sector automóvel, a crise é particularmente severa. As vendas de veículos novos sofreram acentuadas quebras, mas também a utilização das viaturas regrediu como consequência das medidas de confinamento, do teletrabalho e da diminuição da movimentação generalizada de todos nós.

Ora, sendo a aquisição e a utilização de automóveis um importante pilar das receitas fiscais, é possível antecipar que também, a este nível, possa haver um impacto adverso para o Estado, em especial no que se refere aos impostos especiais sobre o consumo, nos quais se incluem o Imposto Automóvel e o Imposto sobre os Produtos Petrolíferos.

No entanto, ao nível da tributação das empresas relativamente à detenção e utilização de viaturas, a legislação prevê um agravamento sempre que as empresas não registem resultados positivos. Falamos da tributação autónoma que incide sobre os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos ou motociclos, excluindo os veículos elétricos, dado que o Código do IRC prevê um agravamento em 10 pontos percentuais das respetivas taxas de tributação, quando os sujeitos passivos apresentem prejuízo fiscal no período a que respeitam os encargos suportados.

Tributação Autónoma: perguntas e respostas

Perante uma conjuntura especialmente adversa e em que muitas das empresas com atividades em Portugal enfrentam o risco efetivo de virem a apurar prejuízos fiscais, não só no corrente ano de 2020, mas também nos próximos anos, será muito penalizador para essas mesmas empresas terem de suportar um encargo acrescido com a tributação das viaturas ligeiras de passageiros que detêm e/ou utilizam.

Esta matéria foi acolhida no âmbito da Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho, que aprovou o Programa de Estabilização Económica e Social, onde se previa, entre as medidas fiscais enunciadas, que deveria ser desconsiderado o agravamento das tributações autónomas devidas pelas empresas com lucros em anos anteriores e que viessem a apresentar prejuízo fiscal no ano de 2020 (ponto 4.3.2).

Não obstante esta manifestação de intenção, a Lei que aprovou o Orçamento do Estado Suplementar para o ano de 2020, e que adotou várias das medidas fiscais elencadas no referido Programa de Estabilização Económica e Social, nada veio ainda a contemplar a referida medida referente ao não agravamento da Tributação Autónoma. Temos assim que a referida medida venha efetivamente a ser adotada que as empresas apurem prejuízos fiscais, ainda que motivados conjunturalmente pela atual situação de pandemia e consequente crise económica, poderão vir a ter um agravamento fiscal associado aos encargos com viaturas ligeiras de passageiros.

Tributação Autónoma para empresas e ENI

Neste contexto, ganha importância acrescida a possibilidade que as empresas têm de excluírem de Tributação Autónoma os encargos referentes a viaturas automóveis relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo de utilização com o respetivo colaborador, nos termos previstos no Código de IRS.

Esta possibilidade, que já em muitos casos, designadamente quando estão em causa viaturas sujeitas às taxas mais elevadas de tributação autónoma, se revelava fiscalmente menos onerosa na comparação entre a tributação autónoma de IRC devida sobre a totalidade dos encargos e o IRS devidos na esfera do colaborador sobre o rendimento que está associado à utilização da viatura, revela-se, desta forma, de particular relevância neste momento.

Tomando como exemplo uma viatura com um custo de aquisição acima dos 35 mil euros, a taxa de tributação autónoma de IRC agravada (pela existência de prejuízos fiscais) que incide sobre todos os seus encargos é de 45%. Havendo acordo escrito entre a empresa e o colaborador a quem a viatura se encontra adstrita para utilização pessoal, a tributação deixa de ocorrer em sede de IRC e passa a incidir na esfera do colaborador, à sua taxa marginal de IRS, sobre um rendimento máximo anual correspondente ao produto de 0,75% do valor de mercado da viatura, reportada a 1 de janeiro do ano em causa, pelo respetivo número de meses de utilização.

Em especial neste novo tempo em que muitas das empresas são chamadas a reinventar-se, poderá merecer ponderação, nos casos que se revele exequível, a referida opção pela tributação em IRS na esfera do colaborador pela utilização de viaturas ligeiras de passageiros.