Ao fim de oito meses, o número de matrículas de ligeiros de passageiros está próximo do resultado de 2021, mas podia estar melhor caso não subsistisse a escassez de carros novos para venda. Apesar do desespero em que vive grande parte do sector que depende do automóvel, a rentabilidade de algumas marcas e concessões cresce com o aumento das margens de um negócio onde praticamente já não se praticam descontos. O mercado de usados floresce ao ritmo do crescimento das importações e há cada vez mais portugueses a procurarem carros elétricos. Novos ou usados.
O “pára-arranca” na venda de carros novos vive ao ritmo da capacidade de entrega das fábricas que, ora interrompem a produção devido à falta de uma peça, ora a retomam para escoar milhares de modelos semiacabados que aguardavam apenas por um componente essencial. Um “novo normal” que permitiu quase duplicar os números de agosto em relação ao valor obtido do mesmo mês de 2022, mais 42% de registos de ligeiros de passageiros que ajudaram a encurtar para menos 0,4% a distância no acumulado dos primeiros oito meses de 2022.
A boa notícia é que basta repetir o resultado de agosto em cada um dos quatro meses que faltam até ao final do ano para que as vendas de ligeiros de passageiros ultrapassem os números de 2021. O que não parece de todo impossível, uma vez que as 11.349 matrículas de veículos ligeiros de passageiros (VLP) novos, em agosto, foram apenas… o segundo pior registo mensal de 2022!
Já quanto aos ligeiros de mercadorias (VCL) não se pode ter a mesma certeza, face a uma queda de quase 20% no acumulado do ano.
Quem ganha é o comércio de usados. Mas será mesmo o único?
“Temos de nos habituar a gerir num ambiente de permanente instabilidade e de volatilidade constante. A incerteza é o novo normal”, proferia Florian Huettl, presidente executivo da Opel, num encontro com jornalistas portugueses durante a sua passagem pelo nosso país.
Esta afirmação sintetiza bem o espírito atual do mercado automóvel a nível europeu, unanimemente reconhecido pela globalidade dos agentes que dependem deste sector.
De facto, o mercado automóvel vive tempos de transformação: cada vez mais construtores assumem a vontade, ou já estão em processo de mudança, para a venda direta de carros e serviços através da internet, dispensando as concessões deste trabalho – alienando até a sua rede de retalho, exemplo da Renault, que tem vindo a vender concessões na Europa e bem recentemente alienou instalações no grande Porto e na grande Lisboa -, assiste-se ao surgimento ou ressurgimento de cada vez mais marcas automóveis (em ambos os casos com base em construtores chineses) e os carros elétricos ganham mais expressão nas tabelas da ACAP.
O atraso na entrega de alguns modelos novos acabou por incrementar ainda mais o mercado de carros usados importados. Quando comparado com o total de VLP novos matriculados em 2022, as unidades VLP importadas usadas representam 65,37% dos VLP novos. Em números concretos, somando as 101.293 matrículas de VLP novos vendidos entre janeiro e agosto às 66.212 matrículas de carros com a mesma tipologia importados usados, este é o resultado: 101.293 + 66.212 = 167.505 registos.
Os números da União Europeia também desceram 11,9%. Nos VLP, uma redução superior a 800 mil viaturas em apenas oito meses.
O total de viaturas importadas usadas cresceu 50,75% em comparação com o mesmo período de 2021. Mas os números incluem uma outra realidade: entre os VLP importados usados em 2022 encontram-se mais de 2.200 viaturas com um primeiro registo feito este ano no seu mercado de origem. Número que não é habitual, uma vez que, em condições normais de mercado, a importação para venda de carros usados da Europa torna-se mais rentável para viaturas que apresentem um primeiro registo com mais de quatro/cinco anos.
Aparentemente, a escassez de carros novos para entrega imediata também parece estar a estimular importações e exportações paralelas de veículos, à revelia (ou eventualmente com a conivência) de representantes das marcas de cada país. Uma busca rápida pelas páginas de alguns comerciantes em Portugal, permite encontrar modelos com pouquíssimos quilómetros, alguns dos quais com indicação de não possuírem ainda qualquer registo, à venda fora dos concessionários das marcas e com a particularidade de apresentarem um preço alguns milhares de euros acima do anunciado pelo representante oficial da marca.
A diferença, claro está, é que estas unidades estão disponíveis para entrega imediata ou com tempos de espera bastante mais curtos, habitualmente poucas semanas, ao contrário da espera de meses que acontece com alguns modelos comercializados através das representações oficiais.
Mas este fenómeno está também a acontecer em sentido contrário: há carros novos que chegam a Portugal e que são reexportados para outros mercados europeus, sendo na maioria viaturas com cilindradas e custos de aquisição mais elevados.
A escassez de oferta volta a ser uma das explicações, embora, neste caso, a justificação possa dever-se ao facto de as quotas de distribuição do modelo em causa já se encontrarem esgotadas no mercado de destino da viatura (nomeadamente porque o “jogo” de controlo de limites de CO2 a isso obriga), ou porque o comprador final do modelo localiza-se fora do espaço da União Europeia (e, pela razão anterior, o mercado tradicional de reexportação destes clientes já não tem unidades disponíveis para entrega).
Quanto valem as compras no mercado do rent-a-car?
A atividade do aluguer de viaturas é das que mais sofre com a escassez de carros, facto que está a representar uma oportunidade para as marcas que vão tendo unidades para entrega.
Um balanço rápido aos primeiros oito meses mostra que este sector foi responsável por 24.194 matrículas, 14% a menos do que no mesmo período de 2021. Isto representa sensivelmente 21% do volume total dos registos anuais, bastante inferior ao que é habitual.
O mesmo acontece nos VCL (menos 11% do que em 2021), dificultando a atividade de muitas empresas que recorrem ao aluguer temporário para colmatar necessidades pontuais.