Com a crescente aposta na mobilidade elétrica por parte das empresas e empresários, surgem inevitavelmente dúvidas quanto ao correto enquadramento fiscal das despesas relacionadas com os carregamentos elétricos, sobretudo quando estes ocorrem fora das instalações da entidade, nomeadamente na residência dos trabalhadores ou dos membros dos órgãos sociais (MOE).

No que se refere ao IVA, desde o OE/2020 que a lei clarificou que o imposto sobre a eletricidade consumida por viaturas elétricas e híbridas plug-in pode ser alvo de dedução por determinados sujeitos passivos, mesmo no caso de viaturas de turismo (1).

Dedução do IVA

Mas afinal, em que condições pode ser deduzido o IVA da eletricidade usada nos carregamentos elétricos?

De acordo com o Código do IVA, só podem ser deduzidas as despesas que estejam devidamente documentadas e diretamente relacionadas com a atividade empresarial.

Assim, a primeira condição, e talvez a mais relevante, é que a fatura da eletricidade esteja emitida em nome da empresa ou empresário. Ou seja, caso o documento que titula a despesa com o carregamento não contenha todos os elementos obrigatórios (2), ainda que a viatura seja da propriedade da entidade, o IVA não será dedutível.

Adicionalmente, só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, salvo as operações especificamente elencadas no Código (3).

Em suma, o IVA será dedutível, desde que:

  • A viatura elétrica ou hibrida plug-in esteja afeta à atividade;
  • A fatura de eletricidade esteja emitida em nome da entidade;
  • O consumo seja comprovadamente afeto à atividade empresarial.

E quando o carregamento é feito na habitação dos utilizadores?

Neste cenário, a situação é mais sensível. Embora a viatura pertença à entidade, se a fatura de eletricidade estiver em nome do utilizador, o IVA não será passível de dedução.

Por exemplo, imaginemos um trabalhador que usa a viatura da empresa para visitar vários clientes e que nem sempre volta à sede da empresa no final do dia. Como utiliza a viatura por dias sucessivos para trabalhar, decide carregá-lo na sua habitação. No entanto, se a fatura da eletricidade estiver em seu nome pessoal, o IVA dessa eletricidade não pode ser deduzido, porque não cumpre os requisitos legais.

Todavia, se a habitação for também a sede da empresa, a solução deverá passar por existência de diferentes contadores de eletricidade, desde que a fatura seja emitida em nome da sociedade.

Vale a pena destacar que, de acordo com o entendimento da Autoridade Tributária (4), o IVA pago na compra e instalação de carregadores elétricos, utilizados nestas viaturas, não pode ser deduzido, uma vez que esta despesa é associada à utilização.

Aceitação das despesas com eletricidade

Quando é que as despesas com eletricidade são aceites como gasto na empresa ou empresário?

Em sede de IRC, as despesas com eletricidade para carregar viaturas elétricas são aceites como gasto da empresa se estiverem associadas à obtenção ou manutenção de rendimentos sujeitos a imposto, devidamente documentadas e registadas na contabilidade (5).

Assim, se a empresa tiver viaturas elétricas afetas à sua atividade, é perfeitamente legítimo que registe contabilisticamente a despesa da eletricidade e a aceite como gasto fiscal, desde que tenha na possa a documentação necessária.

Mas, tal como analisado para efeitos de IVA, a viatura em determinadas circunstâncias pode ser carregada fora das instalações da entidade. Nestes casos, mesmo que a viatura seja da propriedade da empresa ou empresário, se a fatura de eletricidade estiver em nome pessoal do utilizador, a despesa poderá não ser aceite.

A empresa não pode pagar a eletricidade ao utilizador?

Uma vez que os documentos de suporte são normalmente emitidos em nome do utilizador, designadamente por respeitarem à sua residência particular, para que as despesas sejam consideradas na esfera da entidade e reembolsadas ao trabalhador ou MOE, devem ser debitadas por estes, à sociedade (6).

No entanto, a lei não proíbe a afetação parcial de consumos. Assim, se uma parte da habitação estiver a ser utilizada efetivamente ao serviço da empresa (como um escritório ou armazém), é possível imputar parte dos consumos à sociedade. Para isso, é recomendável definir critérios objetivos de repartição.

Diríamos ainda que para garantir associação das despesas à fonte produtora do rendimento, seria fundamental recorrer a soluções formais, como um qualquer contrato entre o proprietário do imóvel e a entidade, permitindo justificar legalmente a afetação de parte da residência à atividade da entidade. Neste contexto, as despesas associadas à utilização (como eletricidade) podem ser aceites como gasto empresarial.

Mesmo que as despesas com carregamentos elétricos sejam aceites fiscalmente e o IVA possa ser deduzido, há ainda que considerar a tributação autónoma (TA).

Esta tributação incide sobre todos os encargos com as viaturas, designadamente gastos com carregamentos elétricos, e variam conforme o tipo e o custo de aquisição da viatura. Por exemplo, para viaturas híbridas plug-in que cumpram certos requisitos (autonomia mínima de 50 km em modo elétrico e emissões inferiores a 50 g CO₂/km), as taxas de TA são de 2,5, 7,5 por cento ou 15 por cento, conforme o custo de aquisição tenha sido inferior a 37.500 euros, igual ou superior a 37.500 euros e inferior a 45.000 euros, ou igual ou superior a 45.000 euros, respetivamente.

No caso das viaturas 100 por cento elétricas, se o valor de aquisição não ultrapassar 62.500 euros, não há lugar a TA. Se ultrapassar esse valor, aplica-se uma taxa de 10 por cento.

Regras diferentes para empresários em nome individual

Para os empresários em nome individual com contabilidade organizada, as regras são um pouco diferentes. Neste caso, é possível deduzir até 25 por cento das despesas com eletricidade, água, telecomunicações e outras, desde que estas estejam diretamente relacionadas com a atividade (7).

No âmbito da TA, também há diferenças, designadamente para viaturas híbridas plug-in cujo valor de aquisição seja inferior a 30.000 euros, a taxa de TA é de 5 por cento, subindo para 10 por cento quando o custo de aquisição é igual ou superior àquele montante. Já as viaturas movidas exclusivamente a energia elétrica não estão sujeitas a TA (8).

Por fim, é recomendável que empresas e empresários adotem práticas formais e documentadas, e sempre que possível, mantenham a separação clara entre consumos empresariais e particulares. Estas medidas são essenciais para garantir a conformidade fiscal e a otimização dos benefícios.

(1) (Alínea A) do N.º 1 do Artigo 21.º Código do IVA
(2) N.º 5 do Artigo 36.º e N.º 2 do Artigo 40.º do Código do IVA
(3) Artigo 20.º do Código do IVA
(4) Ficha doutrinária N.º 24 830
(5) Artigo 23.º do Código de IRC
(6) Ficha doutrinária N.º 25 762
(7) Artigo 33.º do Código de IRS
(8) Artigo 72.º do Código de IRS