Na gestão de frotas automóveis, entre outros fatores, os empresários devem considerar a carga tributária associada à sua aquisição e utilização. Este artigo tem como objetivo abordar concretamente a Tributação Autónoma (TA) no aluguer de viaturas rent-a-car e viaturas transformadas. Apesar da existência de diverso material informativo sobre a TA nos encargos suportados com viaturas, persistem dúvidas na aplicação da mesma em situações particulares.

A Tributação Autónoma tem sido alvo de diversas alterações quanto à abrangência dos gastos sobre os quais incide, bem como relativamente às taxas a aplicar.

O objetivo do legislador com a TA passa por desincentivar os sujeitos passivos à realização de despesas que possam não ser estritamente necessárias às finalidades empresariais, podendo servir as necessidades pessoais de terceiros.

Importa referir que a TA incide, autonomamente, sobre determinados gastos incorridos, independentemente de o sujeito passivo ter obtido ou não lucro tributável. Ou seja, no caso da TA, o facto gerador tributário é dado pela própria realização do gasto.

Estão sujeitos a TA:

  • As pessoas singulares que desenvolvam atividades empresariais ou profissionais e que possuam ou devam possuir contabilidade organizada; e
  • As pessoas coletivas que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e que não beneficiem de isenções subjetivas.

A TA abrange os encargos, como depreciações, alugueres, seguros, portagens e estacionamentos, manutenção, combustíveis e impostos associados à sua utilização, efetuados ou suportados com:

  • Viaturas ligeiras de passageiros;
  • Viaturas ligeiras de mercadorias que não sejam tributadas pelas taxas reduzidas nem pela taxa intermédia do imposto sobre veícu- los (ISV);
  • Motos ou motociclos.

Estão excluídas de TA as viaturas ligeiras de passageiros, motos ou motociclos, afetos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da atividade normal do sujeito passivo, bem como as viaturas relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo de utilização pessoal pelo trabalhador ou membro de órgão social.

As taxas de TA a aplicar aos encargos relacionados com as viaturas supramencionadas dependem de diversos fatores como a sua tipologia, o seu custo de aquisição e o tipo de combustível que consomem.

Com a publicação da Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2024), as taxas de TA, a aplicar no período de tributação de 2024, aos encargos com as viaturas anteriormente referidas sofreram alterações. Assim, apresenta-se a seguinte tabela com as alterações às taxas de TA, para efeitos de IRC.

Conforme podemos verificar na Tabela 1, com a publicação da Lei do OE para 2024, consagra se uma redução das taxas de TA, em todos os escalões, para as viaturas ligeiras de passageiros, viaturas ligeiras de mercadorias referidas anteriormente, motos ou motociclos.

Quanto às taxas de Tributação Autónoma a aplicar aos encargos com as referidas viaturas, para efeitos de IRS, estas não sofreram qualquer alteração, face a 2023.

Tributação Autónoma no aluguer de viaturas rent-a-car

O tema da TA aparenta ser de aplicação direta e relativamente simples. No entanto, poderão surgir determinadas situações particulares em que a aplicação da TA poderá gerar dúvidas.

Conforme vimos anteriormente, a TA nos automóveis dependerá de, entre outros fatores, do valor de aquisição dos mesmos. Ora, pode-se questionar sobre qual o custo de aquisição a considerar no âmbito do cálculo da Tributação Autónoma em encargos suportados com o aluguer de viaturas rent-a-car. Enquanto, num contrato de renting, o valor de aquisição a considerar para efeitos da TA deve ser o montante que o locador utilizou para a determinação do valor da renda1, num contrato de rent-a-car, em princípio, não será possível determinar um valor de aquisição.

Para responder a esta questão, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)2 argumenta que os encargos provenientes dos contratos de rent-a-car, ou seja, contratos de aluguer sem condutor por períodos muito curtos (iguais ou inferiores a três meses, não renováveis), não se tratando de aquisição nem de situação assimilável a aquisição, deve a TA destes encargos ser à taxa de 10 por cento, isto é, à taxa do escalão mais baixo previsto no n.º 3 do artigo 88.º do Código do IRC.

Face a este entendimento, poderão surgir duas questões:

  • Qual será a taxa a aplicar aos encargos com os referidos contratos, para efeitos de IRS?

De facto, será de argumentar que deverá haver uma harmonização entre ambos os impostos sobre o rendimento, pelo que, a taxa de TA aplicável aos encargos dedutíveis com o aluguer de viaturas rent-a-car, em sede de IRS, será a taxa do escalão mais baixo previsto no n.º 2 do artigo 73.º do Código do IRS, ou seja, a taxa de 10 por cento.

  • Qual a taxa a aplicar aos encargos com os referidos contratos, para efeitos de IRC, a partir de 2024?

Conforme analisámos anteriormente, com a publicação da Lei do OE para 2024, as taxas de TA a aplicar aos encargos suportados com viaturas, durante o ano de 2024, para efeitos de IRC, foram objeto de alteração.

Na redação atual do referido artigo 88.º do CIRC, a taxa de TA do escalão mais baixo, para viaturas movidas exclusivamente a gasóleo ou a gasolina, é de 8,5 por cento.

Assim, entende-se que, a partir de 2024, a taxa de Tributação Autónoma a aplicar aos encargos suportados com o aluguer de viaturas rent-a-car será a taxa reduzida, ou seja, de 8,5 por cento.

Tributação Autónoma em viaturas transformadas

De acordo com o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), considera-se transformação a alteração da estrutura, carroçaria, motor, sistemas ou componentes, de um veículo matriculado de modelo aprovado.

Assim, num cenário em que se procede à transformação de uma viatura, alterando as características da mesma, a questão que poderá levantar dúvidas será o valor de aquisição a considerar para efeitos de determinação da taxa de TA.

Será o valor de aquisição pela qual a viatura foi adquirida inicialmente, ou englobará igualmente o custo com a transformação da mesma?

Não havendo um entendimento publicado por parte da Autoridade Tributária, é de argumentar que nos podemos socorrer à definição de custo de aquisição, previsto para efeitos contabilísticos3, isto porque, para o apuramento do lucro tributável, é consagrado o modelo de dependência parcial entre a fiscalidade e a contabilidade.

Em termos contabilísticos, o custo de aquisição de uma viatura poderá compreender:

  • O seu preço de compra, incluindo eventuais direitos de importação e os impostos de compra não reembolsáveis, após dedução dos descontos e abatimentos; e
  • Outros custos diretamente incorridos para colocar a viatura na localização e condição necessárias para a mesma ser capaz de funcionar da forma pretendida.

Quanto aos custos subsequentes (onde se inserem os relacionados com a transformação) se estes produzirem benefícios económicos futuros que aumentem a vida útil (para além da inicialmente estimada) ou o desempenho do ativo, admitir-se-á a capitalização desses encargos. Caso contrário, deverão ser reconhecidos como gastos diretamente na demonstração dos resultados. Esta análise terá de ser feita casuisticamente.

No entanto, para efeitos de determinação da taxa de TA, permanece a questão de qual o valor a considerar.

De facto, os Códigos do IRS e do IRC referem-se, especificamente, ao custo de aquisição da viatura. Todavia, não havendo um entendimento publicado pela AT, acautela-se a possibilidade de o valor da transformação da viatura ser considerado, em conjunto com o seu custo de aquisição, para efeitos da aplicação da Tributação Autónoma.

  1. Informação Vinculativa, processo n.º 2011 004399 com despacho de 2012-03-03
  2. Informação Vinculativa, processo n.º 2012 001228, com despacho de 2012-05-21
  3. Norma Contabilística e de Relato Financeiro n.º 7 – Ativos Fixos Tangíveis do Sistema de Normalização Contabilística